É
voz corrente que o dia 8 de março é o dia internacional da mulher, cujas
comemorações, em cada ano, são sempre pontuais para celebrar as conquistas
deste gênero, mas também para refletir e avaliar até que ponto as lutas pela
eliminação de todas as formas de violência, preconceito e discriminação já
foram abolidas do cotidiano feminino. Sabe-se que a Organização das Nações
Unidas – ONU – desde 1975, entrou na luta pela publicização das campanhas em
prol de ações e socialização das formas de combate à exploração da mulher, formulando em uma convenção específica, a
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a
Mulher (que entrou em vigor em 1981), a criação de várias datas dedicadas à reflexão
sobre a condição feminina. É assim que durante o ano todo, a sociedade mundial
tem observado que os movimentos de mulheres e feministas fazem constar em suas
agendas, as pautas de reivindicações para evidenciar as demandas sobre os
direitos humanos que ainda não aconteceram regularmente na vida das mulheres
e/ou estão em pendências de politicas públicas para o saneamento da
desigualdade. A saúde, a educação, o trabalho, a violência doméstica e sexual,
os direitos humanos de um modo geral têm se tornado pontos focais de dias
específicos marcados pelos reclamos de que ainda há arestas a serem aparadas
nas relações sociais com base nas relações de gênero traduzidas em relações de
poder. Em que pese tantas conquistas, as datas comemorativas são tomadas como instantes
de utilizar os meios positivos de informação e reflexão sobre o que ainda se
traduz como abuso de tratamento a esse gênero. Assim, o dia 25 de outubro recebeu da ONU mais um mérito de
valorização e disseminação de reflexão se constituindo como o Dia Internacional
Contra a Exploração da Mulher.
Entre os vários panfletos e
documentos que fazem parte da avaliação crítica em torno desse processo de
exploração feminina há aqueles que históricamente refletem um passado de
reforço ao tratamento hierarquizado nas relações de gênero denotando o que se
traduz para a recorrência a esta visão de ações “naturalizadas” sobre as
mulheres. Esta posição é seguida, também, por algumas téoricas que estudam a
questão das mulheres. Por exemplo, ao serem vistas ao sabor das diferenças
físicas a partir da biologia – sexo masculino e sexo feminino –, na tradição do
pensamento patriarcal, consideram que os papéis que elas e eles representam se
mantém numa ordem normativa sem questionamento à naturalização dos mesmos. E
dessa perspectiva são mantidas as facilidades para o processo de exploração das
mulheres. É o caso de se entender certas análises de teóricas como Carol
Gilligan (“Uma Voz
Diferente”, 1982) que ao explicar os diferentes modos de
desenvolvimento moral dos meninos e das meninas, em termos de diferenças de
“experiências” (de realidade vivida) constrói sua argumentação ao afirmar: “a
experiência das mulheres levam-nas a fazer escolhas morais que dependem dos
contextos e das relações”, chegando a evidenciar: “as mulheres pensam e
escolhem esse caminho porque elas são mulheres”. Trata-se de uma noção
a-histórica e essencialista sobre esse gênero. Como Gilligan, outros/as
extrapolam sua própria descrição, com base em amostras pontuais de certas
sociedades, no caso dela, de alunos norte- americanos do fim do século XX, para
todas as mulheres. A historiadora Joan Scott enfatiza criticamente: “Essa
extrapolação é evidente, particularmente, mas não exclusivamente, nas
discussões da “cultura feminina”, levadas por certos(as) historiadores(as) que
coletando seus dados desde as santas da Idade Média até as militantes
sindicalistas modernas, os utilizam como prova da hipótese de Gilligan que diz
que a preferência feminina pelo relacional é universal.”
Em outras palavras, a
representação da sociedade reproduz um status
quo feminino ancestral “porque somos mulheres”. Trata-se de uma
inconguência haja vista que essa “cultura feminina” foi imposta desde tempos pretéritos
sobre os costumes e as normas de que nós mulheres deveriamos seguir sendo assim
e não “assado” porque estava escrito no nosso corpo (no caso, a diferença de
sexo). E quando as lutas pelos direitos se implantam, as mulheres que
reivindicam são sumariamente avaliadas em uma representação negativa de seu
gênero = revoltadas, mal-amadas etc.
No caso de pensar a
luta contra a exploração da mulher, celebrado hoje, a ampla dimensão das
desigualdades ainda se impõe. Por exemplo, a organização do lar,
forma
clássica para apresentar os dois sexos e que ainda hoje se encontra instituída
num contexto de dominação: o lar e a maternidade (o espaço privado como o situs
da mulher e a rua e a política, espaço público, o lugar do homem), reproduziu o confinamento da mulher e reforçou condições
especificas para a esfera do privado. Nesse espaço a mulher reduziu-se a
instrumento de reprodução da sociedade (por via biológica), sendo o trabalho
caseiro, na ordem da hierarquia social e econômica considerado a menos
importante das atividades. Esses são atributos ainda presentes em nosso meio e
que tendem a configurar o processo de exploração da mulher.
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