Causar
intencionalmente dano ou intimidação a qualquer pessoa ou ser vivo é o que
chamamos comportamento de violência, uma atitude que tende a atingir a
integridade física, psicológica ou a liberdade de outrem. É qualquer aplicação
de força contra qualquer coisa, embora força e violência se diferenciem, visto
que a primeira no aspecto filosófico, tende a ser caracterizada como
energia sobre algo, enquanto que a violência é expressão de agressão com
emprego da força física ou intimidação moral contra alguém. Assim, manifesta-se pela opressão e
abuso da força, ocorrendo também pelo constrangimento sobre alguém que seja
obrigado a fazer a vontade de outrem. Há formas diversas
de violência, a exemplo, as guerras, os conflitos étnico-religiosos, o
banditismo, a violência doméstica (até bem pouco tempo vista como uma atitude
“natural” entre um casal).
Na
sociedade brasileira a violência se apresenta sob variados contornos, sendo um
fenômeno histórico se pensarmos nela desde a escravidão (indígenas, nos
primórdios, seguindo-se a captura e comercialização da população africana como
mão de obra), no processo de colonização e, enfim, em todas as fases em que o
capitalismo se impôs na constituição do Estado, com o mercantilismo, o
coronelismo, as oligarquias que se tornaram contributores da força física e
psicológica para a imposição da forma civilizatória que estava sendo pensada
para favorecer uma arquitetura para o país.
Os
fatores são diversos no aumento da violência. Os estudiosos referem a
urbanização acelerada, responsável pelo grande fluxo de pessoas para as áreas
urbanas contribuindo para um crescimento caótico das cidades. Outro fator visto
como responsável por esse aumento da violência refere as aspirações de consumo
de uma parte da população que se vê excluída do mercado de trabalho, assumindo
com isso a frustração armada pela não inserção nesse espaço e a satisfação de
seus desejos de gastos pessoais. Por outro lado, estas causas são associadas,
em parte, a problemas sociais tais como a miséria e a fome. Entretanto, nem
todos os tipos de crime derivam das condições econômicas.
No
Brasil os elementos da violência se acham dentro e fora do espaço
institucional. Ela se dá ou como um assalto, visando
roubo, ou um “ajuste de contas”. Há também os atos de violência a partir das
atitudes dos próprios policiais que são pagos para manter a ordem pública. Há
os traficantes de drogas que executam os seus devedores, como há também os que
se vingam de medidas consideradas injustas no seu ponto de vista corroborando
essas práticas e fazendo crescer o número de assassinatos. A repressão ao crime
também leva a odisseia bélica para dentro e fora das casas das pessoas quando
os responsáveis pela segurança se excedem e praticam a maioria das vezes atos
mais arbitrários do que os cometidos. Mesmo
assim, o poder público, tem mostrado incapacidade no
enfrentamento dessa catástrofe social. O mais grave é a constatação de que no
meio desses atos de violência há conivência de grupos milicianos, travestidos
de “exterminadores do crime”. Outros são contratados por “eminências” com cargo
público para eliminarem seus antagonistas. Quantos profissionais liberais e
eminentes magistrados, parlamentares e prefeitos etc., têm sido apontados como
mandantes de assassinatos.
Apresentada
nas mais diversas configurações, a violência ainda tem sido denunciada como um
estigma do espaço privado e doméstico acometendo a mulher, a criança, o idoso/a
exacerbando um meio ambiente que antes era tido como sagrado.
Não
há explicações únicas para o cometimento de atos de violência. Mas a questão
passou a ser um eixo de estudos e de denuncias com a identificação das práticas
variadas de violência a que as mulheres são submetidas no ambiente doméstico e
que muitas vezes só eram/são externadas com a morte .
Heleieth
Saffioti em suas pesquisas sobre a situação da violência doméstica identificou
dois eixos dessas práticas – o poder e a impotência. No primeiro caso, a
ação materializa-se na legitimação da falocracia pela sociedade, mas também
pela necessidade que o homem apresenta de procurar afirmar-se, principalmente
em uniões de caráter estável, repassando à companheira as perdas que teve em
outros tipos de relações sociais que mantém. Essa sensação de impotência – e aí
entra o segundo tipo originário da violência – ele compensa o massacre de que é
alvo em outros campos, contra a mulher e as crianças fazendo “parecer maior o
pequeno poder de que goza neste tipo de relação”. (...) A função do exagero
seria exatamente a de ocultar a pequenez da parcela desfrutada de poder.”(
2000, p.43)
Dessa
forma, o outro eixo do exercício da violência funda-se no medo cultivado na
impotência. “O exercício da violência em busca do (re) estabelecimento do amor
próprio não constitui apanágio dos homens. As mulheres também procedem desta
maneira agredindo crianças, cujo status é inferior ao seu. A violência passa,
assim, a penetrar cada poro do tecido social: ricos violam direitos humanos de
pobres; brancos de negros; homens de mulheres; mulheres de crianças e velhos.”(
p.43)
Em
1994, a Organização dos Estados Americanos – OEA – realizou a Convenção de
Belém do Pará definiu uma das cláusulas do documento assinado pelos
participantes como: “A violência contra as mulheres é uma manifestação de
relações de poder historicamente desiguais entre homens e mulheres conduzindo à
dominação e à discriminação feminina impedindo o pleno avanço das mulheres...”
Percebe-se
que a gênese da violência é plural e não vai se deter simplesmente pela ação
repressora. Vale dizer que a melhora do quadro de violência passa pela tríade
básica que os governos abraçam e a população reclama nas ruas: educação, saúde
e segurança. Somente com a boa qualidade desses serviços teremos uma sociedade
plena de direitos humanos.
(Texto originalmente publicado em O Liberal/PA, em 20/09/2013)
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