sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

MUDANÇAS....


blog.sc.senac.br/voce-tem-medo-de-mudar/

"Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento”. Esta frase é da escritora Clarice Lispector. Ao ler considerei-a uma idéia para tratar sobre o tema da mudança como condição humana em todos os vértices e institucionalidades que esta possa se envolver. Surgiu da constatação de uma situação de adoecimento de uma grande amiga que deixou de ser a mulher produtiva que antes a fazia a grande guerreira dos enfrentamentos e hoje tem suas habilidades bastante circunscritas, embora lúcida em todos os níveis.
Uma constante desde que nascemos é a mudança. A começar pelas etapas da vida. A ciência afirma que só depois de 3 meses a criança começa a conhecer os que a circundam. O que ela pensa antes, desde que se sabe que há marcas de ação cerebral no eletroencefalograma do recém-nato (ou mesmo do feto), não se pode definir ainda. Mas a descoberta de um ambiente é que leva ao eixo de mudanças que se sucederão ao nível do nascimento/crescimento. A fase infantil geralmente dimensiona um mundo que faz bem à criança, por mais que o ambiente não lhe seja lisonjeiro. Muitas criam mecanismos de sobrevivência ainda infantes, às vezes no nível onírico, para fugir ao que não suportam viver. Mas na adolescência há uma gana por mudança. É só reparar agora na onda de protestos sobre diversos assuntos. Quem está na rua protestando são os jovens. E sempre foi assim. Há um ímpeto de idealismo muitas vezes utópico sacudindo uma faixa etária que se sente suficientemente forte para exigir o que e como mudar.
Depois chega uma fase de acomodação. Com a idade, a pessoa segue o que pôde seguir. Quem adquiriu um padrão de vida que acha satisfatório é quem menos propõe mudanças sabendo-se que se o fizer é em nome de outros. E nesse caso, “os outros” esboçam suas demandas a partir de suas próprias necessidades de viver a cidadania envolvendo toda uma comunidade (e aqui lembramos o conceito da ação coletiva de Mancur Olson). E aí é que entra a área da política, emergindo de vivências personalistas e da biofisiologia.
Os candidatos a cargo eletivo, de um modo geral, clamam por mudanças. Dificilmente um/a postulante afirma que vai continuar um programa, especialmente de concorrente. Quando se trata de reeleição, o/a candidato/a afere o que fez de mais significativo em seu entender (ou é assessorado para isso). Esta aferição muitas vezes se faz por detalhes utópicos, baseada no que “ainda pode fazer se tiver tempo”. Esclarecendo-se: às vezes o sentido do que este chama de mudança explica-se pelo tom eleitoreiro da trama do jogo eleitoral.
A reeleição em países como os EUA existiu “ad infinitum” até 1946 quando o presidente Franklin Roosevelt conseguiu se reeleger por 4 vezes. No Brasil, a reeleição seguida a um cargo foi proibida até “as emendas constitucionais n.º 5, de 1994, vetando a reeligibilidade, e n.º 16, de 1997, que passou a permitir apenas uma vez para um mandato a cargo majoritário subseqüente e sem restrição para um pleito não-consecutivo. Os textos originais das Cartas anteriores (1937,1946 e 1967) não fazem menção ao tema”.
Mudar é sempre a fórmula preferida nos diversos discursos. E mesmo na vida de alguns cidadãos. Quantos casais que vivem em choque prometem mudar para continuar juntos? E, naturalmente, cada parceiro promete uma mudança. O que é dificil é a conciliação entre pessoas que pretendem alterar alguma coisa. Se uma rua muda de nome nem sempre os cidadãos comungam da idéia dos legisladores que o fizeram/fazem sem consulta prévia ao coletivo da comunidade. Se a mudança é no trânsito não é simples a adaptação popular a isso. Porque nem sempre o usuário tem ciência da motivação que faz surgir essa nova rota da sua caminhada. Partes de um processo relacional que não vê o outro lado da relação e a responsabilidade da comunicação. O costume, a rotina e o medo do desconhecido sempre atacam a mudança especialmente pela força do hábito em seguir ad infinito uma perspectiva a qual já se acostumaram a conviver.
No plano politico internacional as mudanças propostas por preceitos idearios geraram conflitos tragicos. Os termos "esquerda" e "direita" apareceram durante a Revolução Francesa (1789), e o império de Napoleão Bonaparte quando os membros da Assembléia Nacional dividiam-se em partidários do rei sentados à direita do presidente e simpatizantes da revolução à sua esquerda. Com o tempo se configurou a esquerda como a área progressista, advogada de mudanças e a direita como conservadora. Mas há casos de uma ala se assemelhar com a outra em certos momentos. Por aí se concebe que mudar não é facil embora seja um processo natural da condição humana. Uma adaptação a uma condição relacional entre conviventes e suas posições, sejam elas personalizadas ou institucionais.
Voltando ao que iniciei neste artigo, mudar faz parte de uma certeza em fazer/viver. Só quem se acomoda sabendo que podia melhorar é quem se deixa ultrapassar pelo tempo. Por isso eu senti a dificuldade de minha amiga em mudar o seu estado mórbido. Sadia, ela foi de uma permanente luta por mudanças. Uma guerreira que enfrentou o que muitas pessoas, especialmente mulheres, jamais encararam frente-a-frente. Na doença chega a pensar na acomodação. E é justamente na doença, na luta pela vida, que se deve mudar. Pelo menos é o que se deve desejar aos que nos são caros.


(Texto originalmente publicado em "O Liberal/PA, em 31/01/2014)

domingo, 26 de janeiro de 2014

DA BLOGOSFERA ÀS ELEIÇÕES





Há algum tempo a ordem das coisas determinava a presença e a comunicação oral como o meio mais fácil de um candidato (era masculino, mesmo) chegar à esfera pública e se tornar mais conhecido. Ou seja, embora esse cidadão fosse alguém notório da comunidade, o período eleitoral criava para ele outra identidade, o de se tornar um “político”. Ele deixava de ser visto somente como o comerciante da esquina, o médico, o compadre e tantas outras titulagens, para uma investidura provisória em uma atividade que ele já iniciava com a “carteirinha” profissional, projetando-se para o futuro o seu “que fazer”. Mas esta característica temporária necessitava de um cadastro técnico que era o formato do acesso ao eleitorado com essa nova roupagem. O discurso, as visitas personalizadas nas várias formas de contato pessoal, se ampliavam à medida que a necessidade de alargar-se para um público maior entronizava o palanque real como a tecnologia de maior acesso aos votantes. Essa ocorrência, se antes era conveniente, já caducou. Houve também um reordenamento da massa passiva para um novo protagonismo da política e o cidadão tem se avaliado no mesmo nível social dos governantes.
Presentemente, o foco de exposição do “político” para o eleitorado tomou outro desenho. Se os panfletos, a imprensa escrita, o rádio, a televisão vieram aos poucos transformando a forma de exibição e publicização da figura interessada em se tornar pública e assumir um cargo de representação política (legislativo ou executivo) através do sufrágio, ou seja, no processo de escolha por votação, hoje, além de outras regras de propaganda eleitoral, a tecnologia favorece o surgimento de novos artifícios para atingir vários públicos. Sim, porque se houve inventividade das mídias houve também o surgimento de uma diversidade de público que tende a se instalar em variados canais de acesso externo cujos formatos estão aproveitando não só a tecnologia das redes sociais, mas uma linguagem que beneficie o protagonista da classe política, a exemplo, o marketing.
A internet tem sido um inegável espaço de socialização e a cada dia os serviços dessa tecnologia têm sido responsáveis em chamar a atenção para valores, pendores e mesmo tendências favorecedoras (ou não) para um perfil sedutor ao “político”. O seu uso projeta determinado candidato/a através de um design que se torne “marca registrada” do usuário, seja uma cor, um jingle, um modo de expressão diferenciando-o dos demais concorrentes. Ela se constitui, também, num “ambiente de comunicação que tenderia a transformar o padrão atual de baixa participação política por parte da esfera civil nas democracias contemporâneas” (Wilson Gomes, 2004). Destarte, se se avaliar que a revolução digital criou um impacto estrondoso no mundo atingindo diversos aspectos da sociedade percebe-se que ainda há muito a aferir em torno do público usuário (considerar a classe social) e/ou desses personagens interessados em chegar até a esse público desferindo suas mensagens através desse mecanismo.
Facebook, Twiter, Orkut, Badoo e outras redes sociais públicas on line (há também as privadas e as comunidades de redes fora da internet) têm contribuído, conforme cada tecnologia seja/esteja a serviço de uma linha de comunicação como mediadoras de grupos diversos e comunidades, para a formação de uma cibercultura, conforme Raquel Recuero em seu livro “Redes Sociais na Internet” (2011).
Mas essas mídias também colaboram com a exposição pública dos “políticos” que vêem nesses recursos os meios de explorar o tipo de imagem que querem projetar, favorecendo a apresentação de seus antecedentes sociais, além de suas propostas de campanha transformadas em projetos para o tempo da vitória nas urnas e o assento no cargo de representação política. Fugindo ao tradicional palanque, esses/as cidadãos/ãs (agora, sim, com a entrada das mulheres como aspirantes aos cargos eleitorais) têm então uma maneira própria de se expor configurando um tipo de competidor/a na medida interativa com um público que vai se ampliando cada vez que um/a amigo/a aceita o convite para participar do quadro em que estes se agregam na página específica. No caso das mídias onde o apoio da imagem reflete o visual do/a “político/a” essa presentificação tende a estabelecer um link com a impressão emocional (simpatia/antipatia) que seja possível ter com a pessoa.
E os blogs repercutem também os discursos que antes eram proferidos oralmente em palanques reais (em “Blogs.com: estudos sobre blogs e Comunicação” organizado por Adriana Amaral, Raquel Recuero e Sandra Portella Montardo, há matéria interessante sobre essa tecnologia). Comemorando 10 anos em 2007, hoje esta ferramenta faz parte dos demais meios comunicacionais entre os “políticos” e além deles, entre os partidos, entre pessoas de todos os matizes, aliás, sendo ferramenta para imprimir mais claramente as intenções pessoais dos competidores e suas propostas sobre o processo de participação política. Como dizem os organizadores do livro referido: “Os blogs refletem a liberação do polo da emissão característico da cibercultura. Agora, todos podem (com mínimos recursos) produzir e circular informação sem pedir autorização ou o aval a quem quer que seja (...)”. São eixos fortes mostrando a independência e autonomia que um/a cidadão/ã pode auferir através do uso dessas tecnologias. Os “posts” dos blogs podem garantir aos/às “políticos/as” a conexão entre as ideias que têm e as que provocam reações, mas o mínimo que estes podem querer é a arregimentação de eleitores.

(Texto originalmente publicado em "O Liberal"/PA de 24/01/2014)



sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

FALAR DE AMORES – ABAETETUBA


A praça da matriz (N.Sa. da Conceição) em Abaetetuba. Uma imagem na memória.( Extraido de http://ademirhelenorocha.blogspot.com.br )

Era um dia como outro qualquer. De repente a noticia bombou na mídia: uma área da cidade de Abaetetuba, após uma erosão do solo, causou a abertura de um buraco na parte final de uma rua importante – a Siqueira Mendes. O transbordamento do Rio Maratauira teria sido a causa do problema. Especialistas em meio ambiente explicam, contudo, que há outros fatores responsáveis pelo fato como sejam: a construção de casas sobre o rio e o crescimento desordenado do bairro.
Na geografia da cidade, o rio Tocantins (maior rio brasileiro depois do São Francisco), afluente do rio Amazonas pela margem direita, recebe águas do rio Maratauira e, este, as águas do rio Abaeté, passando a ser um só rio a partir daí. Na beira desse rio, protegido pela ilha de Sirituba, às proximidades de outro rio, o Campompema, de onde se avista a ilha da Pacoca, diz-se que Francisco de Azevedo Monteiro – considerado o fundador da cidade - tomou posse do local como proprietário de uma sesmaria, fundando um pequeno povoado em 1724.
Os detalhes mais formais da história da cidade podem ser extraídos de várias fontes, hoje muito perto das pessoas, tendo os meios de alcance dos mesmos através da internet, dos estudos universitários, do noticiário jornalístico, este, às vezes, ostentando clara demonstração de desconhecimento da cidade e de seu povo.
Avaliando com insistência, pela memória, onde havia sido o deslizamento da área pelo transbordamento do rio, custei a me localizar como possivelmente alguns dos meus conterrâneos que há muitos anos saíram de lá e não mais retornaram. Mas, quem viveu a cidade como a minha geração não pode esquecer esse lugar onde faziamos piqueniques com banhos na maré cheia. Minha mãe chamava de Costa Maratauira (meu pai escrevia Maratauhyra) e o passeio era no Igarapé do Cafezal (ao que consta hoje é um trecho da rua Barão do Rio Branco (onde residiamos). Às proximidades desse igarapé, do lado direito, ficava a residência do “seu” Leandro e dona Aureliana Miranda, cujos filhos eram nossos amigos, a Teca (Terezinha de Lizieux Miranda) e o José Latino.
A vida, na cidade interiorana, se apresentava algumas deficiências não era marcada pelos grandes problemas urbanos, hoje muito presentes, e Abaeté não fugia a regra. O trânsito da cidade era feito a pé ou de bicicleta. Até o médico, “seu” Contente, visitava os pacientes com a sua velha bike. Com a presença do D.E.R. para a construção da estrada abrindo caminhos rodoviários para Belém,  alguns caminhões e tratores passaram a circular nas atividades da cidade. As canoas percorriam as distâncias entre os rios. Eram parte importante do municipio. E nós, crianças que tinhamos parentes nos vários rios da localidade – no Campompema, meu tio Kemel; em Caripetuba e no rio Vilhena, minha tia Mocinha – circulávamos entre uma casa e outra vivendo o rio como “a nossa rua”.
 As responsabilidades da escola não limitavam o dia-a-dia da criançada, mesmo que estas mantivessem dois turnos na sala de aula – no grupo escolar e nas escolas particulares. Ou mesmo as que frequentassem somente estas últimas – com evidência para renomadas professoras como d. Celina Contente, d. Olinda Gonçalves, prof. Maximiano Antonio Rodrigues (Prof. Maxico), profa. Carlaide e Ilza Ferreira, Profa. Elza Paes. E com a facilidade de brincar na rua, correr pela cidade de manhãzinha e tomar banho na maré (nos ancoradouros para as canoas – às vezes perigosos) à tardinha, se tornava uma rotina para as turmas de amigos que se formavam nessas condições. Jogar bola e brincar de roda também faziam parte desses finais de dia.
Mas o tempo do lazer da cidade favorecia os locais onde o banho de igarapé se tornava o motivo mais prazeroso para a reunião da familia, principalmente no comanda da mãe. As áreas mais procuradas eram: o igarapé do João Veleiro, o Cafezal, e aquele que cortava o quintal do “seu” Hugo dos Santos. O que sabiamos deles? De onde provinham? Ou para onde desaguavam? No primeiro, tinhamos a nossa frente todo o rio Abaeté, onde barcos, barcaças, navios e pequenos motores passavam diante de nós. No segundo, certamente a Costa Maratauíra e, no terceiro, infelizmente, desconheço. Sei que ficava no bairro do Algodoal. Eram tempos de curtição das brincadeiras nas várzeas onde um miritizeiro (voz corrente, mas, há polêmica se o certo seria buritizeiro) era cortado pelo caule e se transformava em “objeto de passagem” para o lado seco do terreno.
Mas, pelo que eu sei, o peso da urbanização acobertou os igarapés e transformou-os em ruas, não mais para andar de canoas, mas para circularem carros e demais transportes, deixando de significar o cantar de Ruy e Paulo André Barata. A especulação urbana passou a esplorar esses sitios abrigando prédios, casas residenciais, casas comerciais, estabelecimento os mais variados de uma metrópole. Mas esqueceu de que nessas ruas subjaziam a moinha das serrarias, o caroço de acai, enfim, os elementos que antes faziam a festa da criançada. A rua que era “minha e do mururé”, que ao pisar nela, pisava-se “no peito da lua”, deitando-nos “no chão da maré” deixou as marcas da tragédia e afastou a poesia. Mas o Abaeté (ense, uara, uba), topônimo indígena que significa “homem forte e valente”, com certeza está lá se erguendo para uma nova caminhada de esperança de que amanhã é um outro dia.


(Publicado originalmente em 10/01/2014 em "O Liberal"/PA)

domingo, 5 de janeiro de 2014

RETROSPECTIVAS E AGENDAS - 2014



Sem que eu me veja vivendo o “complexo de Polyana” (aceitar e ficar satisfeita com tudo), ou como dizem “ver o mundo por lentes cor de rosa”, creio que os otimistas não se restringem a reconhecer somente esse lado bom da vida. Ou seja, o que há por trás desse sentimento não é de todo a aceitação incondicional do status quo ou considerar tudo o que está feito muito bom porque poderia ser pior. Embora haja reconhecimento de que muitos créditos podem ser contabilizados às situações pouco visíveis de descobertas, novos comportamentos e atitudes ostensivas levam todos nós a considerar que há desacertos em certas ações que a nosso ver poderiam ter tomado outro rumo. Embarcamos, muitas vezes, em declarações que são feitas sobre casos e descasos da administração pública & outras ações de eminências no poder, sem levar em conta algumas variáveis que se enredam no grande “polvo” criado com braços díspares. Estes, geralmente conseguem camuflar visões internas de seus grupos políticos que embora possam se erguer para deixar clara uma idéia, prendem-se nas artimanhas da alteração das cores aplicando suas células especializadas próprias para isso (o polvo se camufla ao expelir tinta quando foge, alterando sua cor). Daí porque importante se torna o acesso à informação correta, embora não seja negada nossa opção de seguir a representação que criamos. Hoje temos a Lei de Acesso à Informação – LAI - Lei nº 12.527/2011, que  “regulamenta o direito, previsto na Constituição, de qualquer pessoa solicitar e receber dos órgãos e entidades públicos, de todos os entes e poderes, informações públicas por eles produzidas ou custodiadas”.
Mas voltando aos otimistas, também eles sofrem ao constatar a má utilização do recurso público e condenam a aplicação de grandes financiamentos em setores que bem poderiam ser avaliados em segunda instância para receberem verbas públicas. Por outro lado, mesmo a aplicação desses recursos em tal programa básico previsto na Constituição, alguns membros do poder executivo deixam de fazê-lo, sabendo das consequencias que podem vir a incorrer se tal não for seu procedimento de aplicação. Mas, para estabelecer um controle permanente do gasto público no Brasil há um ente importante que é o Poder Legislativo (representação parlamentar nas três instâncias) cuja ação na fiscalização desse gasto deve ser tarefa fundamental para a garantia de sua aplicação, conforme os interesses coletivos. Outro ente importante é a própria população que se prenuncia como sujeito demandante e receptor das políticas públicas e, a meu ver, o principal elemento do controle. Somente assim é possivel conseguir o desenvolvimento nacional considerando-se a vastidão territorial brasileira.
Legisladores e população precisam então aplicar-se em ações no controle de recursos auferidos da arrecadação de receitas provindas do patrimonio do próprio Estado (comercialização de bens e serviços, transferência de tributos etc) que precisa se ater a esses valores e não projetar suas ações de forma a utilizar recursos de terceiros, como sejam, empréstimos de outras fontes (privadas, externas). Passamos muito tempo nas mãos do F.M.I. (Fundo Monetário Internacional), lembrança amarga de um Brasil que definia suas políticas de base de acordo com as determinadas por outrem, políticas que se apresentavam, contudo, como necessidades de seus cidadãos produzindo menos ênfase. Hoje não estamos mais nesse extremo, embora essa dívida externa (cuja história remete a 1824, com o “empréstimo português”) ainda exista, sendo amortizada por nossas reservas, que se ampliaram.
No ano que passou, os protestos de rua seguiram um tipo de controle social sobre as políticas que poderiam estar sob o modelo clássico de políticas públicas, cujos impactos aos beneficiários e/ ou o papel nas relações sociais, segundo Elenaldo Celso Teixeira (2002: 3) seguem a seguinte linha: “a) distributivas – visam distribuir benefícios individuais; costumam ser instrumentalizadas pelo clientelismo; b) redistributivas – visam redistribuir recursos entre os grupos sociais: buscando certa eqüidade, retiram recursos de um grupo para beneficiar outros, o que provoca conflitos; c) regulatória – visam definir regras e procedimentos que regulem comportamento dos atores para atender interesses gerais da sociedade; não visariam benefícios imediatos para qualquer grupo”.
Nas aglomerações públicas de junho-2013 foram percebidos grandes protestos envolvendo uma parte da população realmente interessada em mudanças dessa forma de aplicação dos modelos. Sem dúvida, as injunções do jogo político não se apresentaram com as evidências somente nesse aspecto teórico (tenho informação da presença de movimentos partidários que investiram forte e não foram percebidos), embora as vozes se mesclassem em protestos por demandas específicas e públicas, por definição de lugares politicos e de patrões e patronagens no poder. No prefácio do livro “Cidades Rebeldes: Passe livre e as manifestações que tomaram as ruas do Brasil”(Boitempo Editoria, 2013) de autoria coletiva composta de 16 artigos escritos por intelectuais nacionais e internacionais (David Harvey et. ali), Raquel Rolnik (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo/ USP) avalia a opinião de seus colegas e apresenta a sua própria, conforme o recorte: “Podemos pensar essas manifestações como um terremoto – uma metáfora mais adequada do que o trovão (...) que perturbou a ordem de um país que parecia viver uma espécie de vertigem benfazeja de prosperidade e paz, e fez emergir não uma, mas uma infinidade de agendas mal resolvidas, contradições e paradoxos. (...)”.
Esse é o grande mote para demonstrar que se o controle social não se faz as agendas públicas não mudam. Vamos às ações em 2014. Sem subterfugios partidários nem violências.