sexta-feira, 25 de novembro de 2011

NÃO VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

O dia 25 de novembro foi denominado o Dia Internacional da Não Violência contra a Mulher homenageando três irmãs, ativistas políticas: Pátria, Minerva e Maria Teresa Mirabal, brutalmente assassinadas pela ditadura de Leonidas Trujillo, na República Dominicana. O fato que culminou nesse episódio trágico originou-se de um agravo sofrido por Minerva, assediada por Trujillo durante o “Baile do Descobrimento”, em 12 de outubro de 1949, para o qual fora convidada toda a família. Impulsiva, a jovem repele injuriada o ditador e, então, toda a familia foge do baile antes do final, atitude vista pelos órgãos oficiais como afronta dos Mirabal ao governo. A partir desse incidente as três mulheres e seus familiares passam a sofrer forte repressão. Perdem a casa e os recursos financeiros, contudo, num olhar pelo país percebem o abalo no sistema econômico em geral, com o governo de Trujillo levando ao caos financeiro. Elas formam, então, um grupo de oposição ao regime tornando-se conhecidas como Las Mariposas. Por diversas vezes foram presas e torturadas, mas não deixaram de lutar contra a ditadura. Decidido a eliminar essa oposição, Trujillo manda seus homens armarem uma emboscada às três mulheres, interceptando-as no caminho da prisão onde iam em visita aos maridos. Conduzidas a uma plantação de cana de açucar foram apunhaladas e estranguladas em 25 de novembro de 1960. Esse fato causou grande impacto entre os dominicanos que passaram a apoiar as idéias das jovens, reagindo às arbitrariedades do governo e, em maio de 1961, o ditador foi assassinado.

Em 1981, durante o Primeiro Encontro Feminista Latino-Americano e Caribenho, realizado em Bogotá, Colômbia, o episódio foi relembrado sendo a data proposta pelas participantes do encontro para se tornar o Dia Latino-Americano e Caribenho de luta contra a violência à mulher. A Assembléia Geral das Nações Unidas (em 17 de dezembro de 1999) também declarou o 25 de novembro o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a Mulher, em homenagem ao sacrificio de Las Mariposas.

A tragédia que se abateu sobre as irmãs Mirabal há 51 anos se por um lado configura-se um ato de violência política, também pode ser visto como violência institucional (embora esta inclua outros aspectos infringidos às mulheres), haja vista que foi cometido por forças de um governo constituido. E a partir dele fez eclodir entre os movimentos sociais mundiais o combate às demais formas de violência que se abatiam contra esse gênero.

A violência é um termo polissêmico e o seu uso aponta para as formas diferenciadas de constrangimentos morais, coativos ou através da força física explícita, aplicada por uma pessoa contra outra, num ambiente que pode ser tanto público - no contexto social e político – como privado, no espaço familiar.

Esta percepção levou ao reconhecimento de que certos comportamentos nas relações sociais, embora fossem vistos como “naturais” tramavam contra a dignidade humana. A denúncia dos movimentos de mulheres ao tratamento que muitas mulheres recebiam nos locais de convivência, impedidas de participar de determinada atividade, e/ou em casa, quando agredidas pelo marido, pelos filhos ou pais por não fazerem as tarefas domésticas e/ ou por ciúmes, essas atitudes passaram a ser denunciadas como atos de violência recebendo o tratamento devido de entidades governamentais e ONGs ao considerarem essas condutas destrutivas da condição humana.

Conferências, convenções, acordos, cartas constitucionais e demais documentos internacionais foram abrigando discussões e fundamentos legais para a erradicação das formas de violência que acometiam as mulheres. A Conferencia Mundial de Direitos Humanos de Viena (1993) criou o slogam considerando que "os direitos da mulher também são direitos humanos". E em 9 de junho de 1994 foi assinada pela ONU a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, mais conhecida como Convenção de Belém do Pará porque a Assembléia Geral desse órgão foi realizada nesta cidade. O documento levou em consideração “o amplo processo de consulta realizado pela Comissão Interamericana de Mulheres desde 1990 para o estudo e a elaboração de um projeto de convenção sobre a mulher e a violência”.

Os dados sobre a violência doméstica no Brasil são muito sérios. E já são bem visíveis entre a população. As evidências de que os/as brasileiros/as já reconhecem diferentes formas de agressão como sendo violência doméstica são apontadas na pesquisa do Instituto Avon-IPSOS – “Percepções Sobre A Violência Doméstica Contra A Mulher No Brasil” – realizada de 31/01 a 10/02 de 2011, em 70 municipios das 5 regiões brasileiras, entre homens e mulheres com 16 anos ou mais. Segundo o relatório: “entre os diversos tipos de violência doméstica sofridos pela mulher, 80% dos entrevistados citaram violência física, como: empurrões, tapas, socos e, em menor caso (3%), até a morte. Ou seja, a violência física é a face mais visível do problema, mas muitas outras formas foram apontadas. 62% reconhecem agressões verbais, xingamentos, humilhação, ameaças e outras formas de violência psicológica como violência doméstica, assim como a sexual e a moral”. Para a maioria, esses atos são vistos como uma questão cultural (50%), e consideram que o homem ainda se acha “dono” da mulher (41%) (cf.www.institutoavon.org.br )

A REDEH e o Instituto Magna Mater lançaram este ano a campanha “Quem ama abraça” objetivando a atenção da população para o seguinte quadro: “a cada duas horas, uma mulher é assassinada no Brasil; seis em cada dez brasileiros conhecem alguma mulher que foi vítima de violência doméstica; 30% das mulheres brasileiras já sofreram algum tipo de violência doméstica; a cada dois minutos, cinco mulheres são violentamente agredidas no Brasil”. Isso ainda é alarmante.


(Texto originalmente publicado em "O Liberal" (PA) em 25/11/2011)



sábado, 19 de novembro de 2011

PROGNÓSTICOS & (IN) DEFINIÇÕES


Joga-se no google a frase “nomes de candidatos a prefeito no Pará 2012” e saltam mais de três milhões de resultados em apenas 24 segundos. Não se restringem ao nosso Estado, mas aos demais estados da federação que estão na mesma perspectiva de avaliar as possibilidades de seus líderes para lançar, aos cargos majoritários municipais, os prováveis agregadores dos votos de cada partido em cenários diversos do país e em diferentes acordos pré-eleitorais para o próximo pleito. Quando a frase se restringe à cidade de Belém, encolhem os resultados para milhares de evidências de consulta, sejam blogs privados e partidários, notícias jornalísticas, opiniões, reportagens sobre encontros formais de diretórios estaduais e municipais que estão tratando da questão da sucessão municipal. O “agora” tem algum tempo, mas, as comissões para o acompanhamento das próximas eleições só então se constituem formalmente.

O assunto, como se diz, está posto no cenário social e político. Sim, porque hoje, esse tema não é privativo de eminências pardas ou não dos partidos políticos, mas está sendo tratado em todas as conversas sejam particulares ou as de “pé de ouvido” do eleitorado atento quando a troca de informações sobre o “disse-não-disse” das articulações intra e interpartidárias alcança as redes sociais e se transforma em opiniões estilhaçadas entre o “achismo” e as probabilidades que se conjugam em nome de algumas alternativas encimadas pelo jogo das negociações.

A análise política não se restringe ao noticiário da mídia nem mesmo às informações capturadas de conversas informais com lideranças partidárias. Sem dúvida estas variáveis contam entre as demais que devem ser verificadas para uma avaliação do cenário onde estão sendo cunjugados os fatores de indicação e/ou recrutamento das candidaturas aos cargos majoritários municipais. Numa avaliação melhor construida é necessário considerar variáveis internas e externas que agregam: o perfil do partido em eleição anterior, os protagonistas dessa competição, exitosos ou não, o número de votos recebidos (nominais e de legenda), as coligações que se cruzaram nesses pleitos e no processo de governo (partido incumbente), as que se constróem decorrentes da derrota partidária (os não exitosos) avaliando os erros e o que ficou inexplicado no ambiente competitivo. Há outras evidências que se tornam também necessárias para a análise, como, atualmente, as pesquisas internas que os partidos promovem para verificar com quem poderão contar no recrutamento que fizerem de seus/suas filiados/as. Há uma variável importante para todos os que pretendem reeleição e aos aspirantes da legenda do gestor anterior: a perspectiva do voto retrospectivo, ou seja, a conjunção entre os votos obtidos por esse gestor da mesma legenda e os investimentos que fez nos programas sociais. Contudo, há o fato eventual ou ocasional, ou seja, aquele que não é pensado e, por vezes, dá o xeque-mate na expectativa construída.

O noticiário local revela nomes de lideranças partidárias que estão com alta visibilidade diante dos eleitores belemenses. Com a vitória de Simão Jatene ao governo do Estado, o PSDB estaria muito bem na indicação de um membro do partido para concorrer à prefeitura de Belém (e de outros municipios aos quais tem prefeitos no exercicio do mandato). Nesse caso, surgiram especulações aos nomes de Zenaldo Coutinho, reeleito à câmara federal e atual presidente d partido, e de Flexa Ribeiro, o senador eleito com a maior votação ao cargo. A leitura dos votos (nominais e de legenda) dos dois nas eleições de 2010 e os cargos partidários já ocupados podem ser medidas favoráveis ao lançamento de suas candidaturas, entretanto, é possivel que haja tensão intrapartidária que obriga a legenda a constituir-se em grupos que mantém e expõem fraturas pouco saudáveis ao êxito. Há evidências sobre isso: no final de setembro, uma revista nacional divulgou os contatos do prefeito de São Paulo Gilberto Kassab interessado em aumentar o quadro de senadores do partido, com Flexa Ribeiro, sobre a integração deste ao recém-nascido PSD. O senador ficou de dar uma resposta dias depois, contudo, sabia que no dia 7 de outubro vencia o prazo dado pelo TSE para as filiações dos interessados na competição aos cargos de prefeito e vereador. Nessa reportagem diz Flexa: “Mesmo se me filiar ao PSD, continuarei na oposição construtiva”. Na mesma noticia há o fecho: “Ribeiro pretende disputar a prefeitura de Belém em 2012 – o nome do deputado Zenaldo Coutinho (PSDB-PA) também é ventilado para concorrer ao cargo”. Na verdade, houve embate entre os dois líderes pela presidência estadual do partido, que foi parar na mediação do Senador Sergio Guerra, presidente da executiva nacional da legenda, dizendo a notícia: “o clima entre os tucanos (...) foi de pacto pelo silêncio”.

Outro aspecto que tem que ser avaliado é a composição de alianças partidárias feitas pelos líderes do PSDB para eleger o governador. PMDB e PPS estão nesse entorno. E ambos fidelizaram num formato diferente. O primeiro tinha um compromisso firmado nacionalmente com o Presidente Lula, para apoiar o PT e, no caso do Pará, seguir coeso com a candidatura de Ana Júlia Carepa. Ao que consta (noticiários públicos, contatos com lideranças), uma série de intrigas açodadas pelas tendências e por lideranças desse partido, afastaram a sintonia interativa entre as duas legendas antes das eleições. O não-importismo com a aliança nacional, em que pese a ostensiva exposição de imagens entre os supostos aliados configurou a ausência dos próceres do PMDB no estímulo à candidatura de Ana Julia.

Há outro acréscimo de uma variável nesse tom de negociações entre PSDB e seus aliados: o apoio que seria dado à candidatura de Arnaldo Jordy (PPS) eleito com a maior votação à câmara federal e uma das legendas que favoreceu a soma de votos à eleição do atual governador. O que se nota é um esfriamento desse acordo e um excitamento do PPS pelo retorno às negociações internas e externas, além da exposição, na mídia, das atividades do deputado, conversa com prefeitos e outras lideranças de outros municipios, sem que seja ventilada a idéia de Jordy deixar de ser o candidato da legenda.

O PTB, comandado pelo prefeito Duciomar Costa está acenando com a candidatura de Almir Gabriel que pretende concorrer ao cargo por essa legenda. Pergunta-se: não seria essa uma pressão do alcaide ao apoio do governador para a abertura de negociações para a composição do governo? Sabe-se que já houve conversas nesse tom com outras lideranças que já deixaram o partido. Outra questão posta: Almir agrega ou desagrega com a sua candidatura? O que detona com os seus efeitos, considerando que ele mantém um grupo fiel de extração do PSDB: o esgarçamento da sintonia entre PSDB e PPS e a derivação de votos para Edmilson Rodrigues do PSOL?

Há fatos noticiosos que exploram outras candidaturas. O interesse era tratar de variáveis. Assunto a ser retomado.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

MEDICINA SOCIAL

A mídia e as redes sociais instigaram o debate sobre agendas e controle social do SUS - Sistema Único de Saúde tomando, como a ”bola da vez”, o câncer de laringe que acometeu o ex-presidente Lula da Silva, registrando que o mesmo “devia se tratar pelo SUS”. Foi percebido, dessa enxurrada de micro-referências, que alguns sintonizavam com certo recalque, como disse o também ex-presidente FHC, tanto contra o político Lula, como pelas freqüentes denúncias sobre as falhas do sistema em muitos casos ao ser acionado pelos usuários.

Com todas as deficiências que a mídia propaga e às queixas pela sua ineficácia, o Sistema Único de Saúde existente no Brasil é um dos raros meios de qualquer pessoa conseguir tratamento médico entre muitos países do mundo onde é implantado. Recentemente foi evidenciada a luta que o Presidente Barack Obama iniciou, nos EUA, em torno de um programa de medicina social para que o povo norte-americano tivesse acesso a tratamento de saúde em rede publica. Lá existem os Planos de Saúde, como aqui, mas esses planos custam dinheiro. O governo não entra com a receita do gênero como não entra na educação em sua terceira etapa (as universidades são todas pagas). Foi execrado.

A historia do SUS começa a ser contada quando nasceram as chamadas CAPS (Caixas de Aposentadorias e Pensões), uma criação da Lei Eloi Chaves em 1923. O sistema era de capitalização e quem quisesse uma aposentadoria melhor depositava para isso. Em 1930, o governo Vargas suspendeu a CAPS por seis meses para reestruturação. Criou os IAPs (Institutos de Aposentadorias e Pensões), autarquias nacionais subordinadas ao governo federal. Geralmente, os que se graduavam em Medicina passavam a assumir um posto num desses institutos, não havia concurso, mas indicação para a função. O mais modesto era o IAPETEC (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Empregados em Transportes e Cargas). Esses institutos pagavam por atendimento em consultório particular, com um número-teto de clientes, podendo atender até 20/dia, e os profissionais recebiam apenas uma taxa que não poderia ser ultrapassada.Eles ofereciam remunerações diferentes atendendo às classes sociais a quem beneficiavam. Assim, por exemplo, o IAPB (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários) dava regalias que chegavam a pagar ao medico o preço de uma consulta particular desse médico.

A modalidade de assistência à saúde corria no plano federal em paralelo com os planos estadual e municipal. Estes atendiam em postos espalhados pelos bairros e os contratados (médicos, enfermeiros e assistentes sociais) eram assalariados dos respectivos governos. Este paralelismo prosseguiu até quando o governo militar uniu os institutos em um só, chamado INAMPS (Instituto Nacional de Previdência Social).

Para ter acesso a benefícios do INAMPS o usuário precisava mostrar a sua carteira de trabalho, ou seja, o benefício de assistência médica era restrito aos empregados que contribuíssem com a previdencia social. Os demais eram atendidos ou pelos postos estaduais ou municipais e por entidades filantrópicas.

Não vou detalhar aqui o histórico da criação de políticas de desenvolvimento das áreas da saúde pública, em nivel de governos possibilitados pelo controle social das conferências de saúde e dos sanitaristas desenvolvimentistas que mostravam a necessidade de redefinir a identidade do então criado Ministério da Saúde. O certo é que a Constituição Federal de 1988 determinou como dever do Estado a garantia da saúde a toda a população, criando o Sistema Único de Saúde. A Lei Orgânica com os detalhes do funcionamento do Sistema foi aprovada em 1990, pelo Congresso Nacional.

No Sistema Único de Saúde ficaram os centros e postos de saúde federais, os hospitais - incluindo os universitários, laboratórios, hemocentros (bancos de sangue), os serviços de Vigilância Sanitaria, Epidemiológica, Vigilância Ambiental, além de fundações e institutos de pesquisa, como a FIOCRUZ (Fundação Oaswaldo Cruz) e Instituto Vital Brasil.

Exemplificando situações pessoais, lembro que meu pai disgnosticado de cancer de pulmão foi tratado pelo SUS e meu irmão, anos depois, com cancer de laringe, também teve o SUS como apoio do tratamento. Não tínhamos planos de saúde. Eles sobreviveram a média de tempo que se dava aos pacientes desses males em épocas passadas (anos 80 e 90). Os dois só não se restabeleceram por problemas correlatos como um marca-passo, no primeiro, e uma localização ingrata do tumor do segundo, próximo à carótida e considerado dificil de ser removido cirururgicamente.

Não estou só nesse reverência ao SUS. Tenho uma filha concursada que trabalha na assistência médica estadual. Tem argumentos contra muitas queixas que chegam à imprensa. Não defende um cargo, mas o bom senso. Por isso não vejo campo irretocável nas criticas que leio e ouço. Evidente que num sistema capitalista um programa nitidamente socialista gera no minimo controversias. Mas tem falhas, sim. O jornalista Michael Moore no seu documentário “SOS Saúde”(2007) elogiou o sistema de atendimento médico em Cuba, mas não é possivel negar que se trata de um país socialista. No filme “Contágio”(2011) que está sendo exibido no Brasil, critica-se o atendimento público a partir do que se vê em ambulatórios e hospitais norte-americanos. E se o nosso programa chega até mesmo a oferecer medicamentos, o filme explora a luta pela compra de remédios com reflexo da ambição de certa indústria farmaceutica que chega a produzir placebos como drogas anti-virais. Também é criticada a politica que rege a entrega de vacinas, e não se vê, como aqui, campanhas de vacinação em massa, mostrando o povo em luta nas filas por doses do que lhe possa imunizar de uma doença grave.

Pelo histórico referido não é motivo de anedota ou de conceito malsão o endereço do SUS a doentes que podem se consultar em áreas particulares. O nosso sistema existe, há falhas, mas a verdade é que pior seria sem ele.

(Texto originalmente publicado em "O Liberal" -Pa, em 11/11/2011)

domingo, 6 de novembro de 2011

UMA POLÍTICA DE MUITOS PLANOS



Em junho de 2011 a Ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres/PR e Presidenta do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, Iriny Lopes, ao assinar a cartilha da 3ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres que daria sustentação às discussões nos eventos municipais e estaduais deu uma definição exemplar que nem sempre é levado em conta pelos governos e pela sociedade civil: “A política se constrói a partir do cotidiano das mulheres nas suas comunidades, municípios, estados. São essas milhares de brasileiras que devem pautar o governo e a sociedade. Graças a elas o Brasil tem avançado, mas precisamos ainda mais para reparar séculos de discriminação e preconceito” ( http://www.sepm.gov.br/ ).

Para muitas pessoas essa conclamação às mulheres para apresentarem suas demandas e discutirem suas necessidades nessas conferências ainda se constitui em “coisas de mulheres que querem fazer confusão”, “são feministas”, dizem outros/as, num tom de recriminação. Na verdade, esses eventos são parte das funções de Conselhos criados entre as várias categorias e/ ou grupos que se formam na sociedade, de maneira coletiva, com o objetivo de participação na formulação de políticas públicas. Eles têm uma série de funções discernindo-se, como questão-chave, a inserção à parceria dos governos para pensarem em conjunto o déficit da sociedade civil na vivência da cidadania de qualidade da qual têm direitos.

Até aqui, muitos conceitos se tornaram evidentes. Um primeiro é o de cidadania que todo mundo menciona, mas nem sempre sabe que se trata do exercício ou vivência de direitos individuais, políticos e sociais, que são assegurados na nossa Carta magna, a Constituição Federal.

Quanto ao Conselho de Direitos, ao levar à vertente das políticas públicas, define-se como: “uma reunião de diversos atores vinculados a uma determinada política pública. Juntos, eles refletem sobre a realidade local, discutem e decidem sobre uma política ou uma determinada questão. O objetivo de um Conselho é ampliar a participação popular, garantir a descentralização do poder e exercer o controle social; enfim, a atuação do Conselho fortalece a sociedade democrática” (www.pucpr.br/). Trata-se de órgãos colegiados, permanentes, paritários e deliberativos, incumbidos de formular, supervisionar e avaliar as políticas públicas. São criados por lei federal, estadual e municipal. Contudo, há os criados por iniciativa popular, como o atual Conselho de Segurança Alimentar. Esses órgãos apresentam representantes de uma dada comunidade e, dessa forma é que a sociedade participa da gestão pública. Nesse caso, se o povo tem participação na formulação de políticas, não vindo estas de cima para baixo, pode-se dizer que o Estado tem uma vivência republicana porque o povo é soberano, com possibilidade de intervir nas demandas de políticas, propondo, discutindo, definindo questões prioritárias, além de acompanhar o processo de efetivação das decisões tiradas nas conferências, ou seja, a sua execução e, nesse caso, fazendo a fiscalização e o controle dessas decisões para a implantação das mesmas.

Politicas públicas - que são as ações definidas para o bem-estar da sociedade - conceitua-se de forma estrita como a totalidade de ações, metas e planos (nacionais, estaduais ou municipais) traçados para o alcance desse bem-estar dos/as cidadãos/ãs. Não tratarei das decisões sobre essas políticas, contudo, é importante entender que numa sociedade democrática, as fianças aos direitos humanos se fazem através dessa busca pela melhoria da sociedade pelos diversos segmentos sociais. E, mesmo assim, há ainda, alguns fatores que emperram as decisões para a implementação dessas políticas, vendo-se o que é que o governo vai considerar prioritário ou não, ou seja, os grupos apresentam as suas demandas, mas o Estado é quem decide o que vai implementar. E nessa evidência de quem é quem na decisão política que é possivel avaliar a importância da presença das mulheres e de outros segmentos nos cargos decisórios como os parlamentos representativos, por exemplo.

Há vários segmentos sociais no Brasil que hoje se articulam para apresentar suas reinvidicações como: o Conselho de Educação (o primeiro ocorreu na Bahia, em 1842, com funções análogas aos dos ingleses); o Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente; Conselho das Mulheres; Conselho de Assistência Social; Conselho de Saúde; Conselho de Segurança Pública; Conselho de Segurança Alimentar; Conselho do Idoso etc.

Quanto ao Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM) foi criado no Brasil em 1985, vinculando-se ao Ministério da Justiça. Objetivava promover políticas visando a eliminar a discriminação contra esse gênero, além de assegurar sua participação nas atividades políticas, econômicas e culturais do país. Suas atribuições e funções alteraram-se bastante e, em 2003, integrou-se à estrutura da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres da Presidência da República. Sua representação compósita inscreveu representantes da sociedade civil e do governo, ampliando-se “o processo de controle social sobre as políticas públicas para as mulheres” (SPM/PR).

Avaliando a recente IV Conferência Estadual de Políticas Públicas para as Mulheres, no Pará, foi produtivo presenciar as questões das conterrâneas que participaram das conferências municipais trazendo para discussão, na estadual, as suas preocuações com a comunidade onde residem, com a familia, com o trabalho, com os meios de enfrentar a violência doméstica, com o direito á terra, à saúde, à educação, à autonomia de gestão, à raça e etnia, aos meios de participação política com ênfase na demanda para incentivos aos partidos para que as reconheçam como líderes e não como responsáveis por “serviço partidário”. Percebi que esse contorno da política partidária é o que trouxe mais tensão para o grupo que privilegiou esse eixo temático.


(Texto originalmente publicado em "O Liberal", PA, em 04/11/2011)