sexta-feira, 29 de junho de 2012

ENTRE COLIGAÇÕES E CONVENÇÕES



Nestes últimos dias, as averiguações sobre articulações, conchavos, coalisões com expectativas racionalizadas de custos e ganhos (benefícios) sobre indicações de candidaturas partidárias aos cargos majoritário e representativo municipal no Brasil, ganham informativo nos blogs e demais redes sociais numa especulação que chega ao ápice expressivo, em algumas, de projeções advinhatórias. O motivo é conjecturar sobre as definições de nomes dos concorrentes desses cargos que serão apresentados pelos partidos para homologação no dia D da Convenção, esta, a agência formal da Justiça Eleitoral. Amanhã, 30, será esse dia em que os partidos apresentarão uma lista onde devem constar seus indicados aos cargos de prefeito e de vereador, para a eleição municipal de outubro próximo. Mas têm até o dia 5/07 para inscrever em definitivo nos T.R.Es.

No Pará, o jogo especulativo tem exposto cenários interessantes em que os partidos grandes procuram afinar seus objetivos e interesses aos partidos médios, sem esquecer que há, ainda, como fiel da balança, a figura do micro partido. Por outro lado, variáveis com expressivo significado nacional com projeções para as eleições gerais de 2014 se acumulam nessa odisseia de situar uma chapa expressiva que leve à vitória e crie dividendos para o pleito futuro.

Em recente artigo elaborado em conjunto com os colegas Roberto Corrêa e Franciélcio Belúcio (a ser apresentado em agosto próximo num evento nacional), construímos uma fórmula para evidenciar o tamanho dos partidos no estado, considerando as eleições de 2010. Levando em conta os partidos parlamentares, encontramos grandes e pequenos partidos sem comprovar presença aos médios, mas aos não-parlamentares (aqueles que não apresentam eleitos/as nessas instâncias representativas – AL e CD). Desse conjunto extraído pela fórmula, estão sendo formadas as coligações para as eleições de 2012, em que, cada partido, irá prever e pesar custos e ganhos, não mais do que isso, para confirmar suas pretensões. Assim, considerando que entre os primeiros – PMDB, PT, PSDB – todos apresentam pré-candidatos para o cargo majoritário (prefeito), avaliando, ainda, que alguns dos chamados partidos menores dessa fórmula - PR, PTB, PDT, DEM, PPS, PSC, PSB, PMN, PP, PRB, PSOL, PV - também pleiteiam indicar nomes, era de supor que os não-parlamentares - PC do B,  PHS, PRP, PRTB, PSDC, PSTU, PT DO B, PTC, PTN – não se alinhassem nessa elite competitiva, devido a falta de organicidade parlamentar entretanto, já se destacam, há algum tempo, nas mídias, certos filiados que preveem indicação a esses cargos em suas convenções.

Verifica-se que entre os maiores partidos paraenses há expectativa de aplicar-se um eventual jogo estratégico – o partido X incumbente já escolheu seu pré-candidato, sendo aliado, em eleições anteriores, ao partido Y, que também apresenta pré-candidatura de um filiado. Com uma agenda de alianças em formação além de certo grau estratégico de poder de decisão, X tentará seduzir Y que por ter sua agenda própria de transações e com um pré-candidato demonstrando um longo currículo com ativos de poder significativos, os recursos de troca serão altos ou então esta aliança não vai interessar a Y. Porque embora não se force uma aliança, esta se forma em um contexto de necessidades estratégicas que levam a perda de ambos os lados, esperando-se que o resultado seja positivo e compensador para ambas as partes. A relativização desse enredo envolve, contudo, as negociações entre esses líderes no “jardim secreto” tendendo a reduzir o inevitável jogo intentando que a moeda de troca permaneça eficaz.

Tome-se como exemplo o pré-candidato Arnaldo Jordy (PPS), deputado federal com 81,8% de sua votação nominal concentrada na Mesorregião Metropolitana de Belém, e maior concentração de votos segundo os números de municípios efetivos (Mef =2,28). Este é um dado que pode promover outra maneira de enfrentar a sua (como estão chamando) “desidratação”, pelas lideranças do partido incumbente interessado, naturalmente, em que seu pré-candidato esteja no segundo turno. E entre os deputados estaduais eleitos, nesse mesmo cálculo, está Edmilson Rodrigues(PSOL), com a concentração de votos na RMB segundo o Mef = 1,36. Esses dois candidatos têm em mãos um alto padrão de ativos de poder que se tornam, assim, pontos estratégicos em moedas de troca nas alianças que possam estar sendo tramadas.

     Na verdade, jogos intra e inter partidários são maneiras de viabilizar recursos em tempo de campanha, sejam minutos a mais no horário eleitoral, seja agregação de representatividade e influência eleitoral do partido. Há, também, as projeções para próximos pleitos, então, nesses blocos coligados preexistem candidaturas manufaturadas prevendo não o cargo ao qual competem, mas outros que só o futuro dirá.


(Texto originalmente publicado em "O Liberal" de 29/06/2012)

domingo, 24 de junho de 2012

AS NORMAS E O GESTO



O prazo para as convenções partidárias fecharem suas indicações às candidaturas de seus filiados/as aos cargos das eleições de outubro do corrente está aberto desde o último dia 10 indo até o próximo dia 30.
          Os pré-requisitos para um cidadão ou cidadã brasileiro/a se tornar um/a candidato/a constam das normas eleitorais, têm unanimidade estatutária e constituem um atributo fundamental na competição eleitoral – a nacionalidade brasileira; o pleno exercício dos direitos políticos; o alistamento eleitoral; o domicílio eleitoral na circunscrição; a filiação partidária. Neste caso, as condições estatutárias revelam um processo ampliado de inclusão dos cidadãos entre os membros pretendentes de candidatura. Mas a Constituição Federal, Art. 14, § 3º, I a VI, que precede as demais normas, instrui as condições de elegibilidade com vários requisitos entre os quais a idade mínima para os diferentes cargos – 35 anos para presidente e vice da República e senador; 30 anos para governador e vice; e 21 para deputado federal, estadual e distrital. Esta variável teve uma gradual evolução na história do voto no Brasil (cf. Nicolau, 2002).

Em outros países, há partidos cujas exigências a um filiado abrangem requisitos em atitudes que o pretendente deve ter no seu cotidiano, como o de matricular os filhos em escolas públicas, ao invés de escolas católicas, exemplo dado por Hazan (2002), sobre o Partido Socialista Belga. Mas a maioria se adequa aos requisitos partidários e legais exigidos na estrutura de oportunidades como a nacionalidade, fundo de campanha, tempo de filiação, idade, métodos de preenchimento de vagas entre as eleições, conforme alude Norris (1997).
           Outras variáveis podem ser exploradas na formação de candidaturas, como a de cultura política e mudança cultural, para pensar a questão de gênero e explicar o motivo de baixas barreiras legais determinarem o número reduzido de mulheres que procuram candidatar-se comparativamente aos homens. Se não há obstáculo legal para que as mulheres procurem se incluir entre os candidatos, há obstáculos culturais que abrangem a motivação para fazê-lo. O capital político exigido aos pretendentes ao cargo eletivo é uma forte variável exógena (requisito imposto) aos que ingressam na disputa eleitoral.

       Até 1995, a indicação de candidatos/as regulamentava-se pela Lei 5.682/71, sendo um processo uniforme entre todos os partidos. Com a Lei 9.096, de 19/09/1995, excluiu-se da legislação nacional o processo de seleção de candidatos, formalizando-se nos estatutos dos partidos. No Capítulo III – Do Programa e do Estatuto – o Art. 15, ao enfatizar o conteúdo normativo partidário (filiação, direitos e deveres dos membros, fidelidade e disciplina partidária), dispõe, em seu item VI, sobre as “condições e forma de escolha de seus candidatos a cargos e funções eletivas”.

Em 2002 (ano em que analisei 28 estatutos partidários), o único partido a registrar uma pré-seleção de candidaturas para todos os cargos em seus estatutos era o PT, considerando os três níveis de atuação: nacional, estadual e municipal. O controle da oferta de candidatos aos cargos eletivos do partido (Art. 127 a 134) se dava desde a pré-seleção, distribuída entre estes níveis, em três ou quatro formas de apoio, segundo a competência da indicação, para posterior encaminhamento à Comissão Executiva.
        Nas normas estatutárias, o pretendente a um cargo eletivo mantinha-se através de um selecionador prévio responsável pela indicação coletiva do/a filiado/a qualificado, para ser aceita a oferta de seu nome pela Comissão Executiva do partido. Qualquer pré-candidatura poderia sofrer pedido de impugnação até quinze dias antes da realização do Encontro (Art. 132), órgão do partido e instância deliberativa para receber as indicações de nomes apresentados pela Executiva, colocar em votação as impugnações e respectivas defesas, elaborar a lista final e submeter à votação dos presentes. Aprovada, seria encaminhada para a terceira instância do selecionador, a Convenção Oficial para homologar as decisões saídas do Encontro Estadual. A Convenção apenas formalizaria o que já ficara decidido nos Encontros de cada circunscrição eleitoral: "decisões democraticamente adotadas nos Encontros nos termos e nas demais resoluções da instância nacional do Partido" (Art. 143, § 1º).

         Entre essas normas e o gesto de Lula ao apertar a mão de Maluf numa reunião na casa deste último, define-se um jogo perverso na hora de certas alianças que são feitas nas articulações eleitorais pela conquista do poder. Dai a surpresa de muitos e a indignação de outros considerando a biografia diferenciada de cada um deles.

sábado, 16 de junho de 2012

HISTÓRIA E NOTÍCIAS



Nos dois últimos textos escritos para este espaço referente a episódios da política paraense, tenho avaliado o aprendizado que está sendo repassado nas escolas do ensino médio sobre os fatos que constroem essa história, de que forma, e se há uma disciplina que projete aos alunos e alunas, nessas series iniciais, estudos sobre a formação política e social do estado sendo partícipes figuras hoje lembradas através de nomes de ruas, homenagens pontuais comemorativas de feitos ou fatos ocorrentes. No meu “laboratório experimental”, procuro fazer perguntas aos próprios universitários sobre o conhecimento deste ou daquele personagem paraense e/ou se sabe o motivo da escolha para nomear um dado monumento. Percebo que há uma grande defasagem de informação. Não porque a matéria esteja de fora dos programas dessas séries escolares, mas suponho que outras informações mais gerais são privilegiadas nos livros paradidáticos usados nas escolas. E, creio, há outras preocupações em repassar conhecimentos mais amplos e menos de cunho regional ao ensino médio do que a compreensão da história da formação social brasileira, no capítulo paraense.

Num texto elaborado pelos professores  William Gaia Farias, Magda Maria Ricci e Fernando Arthur de Freitas Neves, da Faculdade de História/UFPA, em junho de 2006 para a criação de um “Curso de Formação Continuada para professores do Ensino Médio da rede pública com dificuldades de garantir qualificação profissional” (http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/, observei o interesse dos autores em repassar uma base de expertise aos seus colegas que estão em sala de aula com turmas significativas de alunos onde esta matéria é básica. A vertente metodológica e os temas sociais e culturais organizados em módulos oferecem um quadro painelistico muito interessante integrando as várias áreas de conhecimento para contribuir com o conteúdo da História a ser repassado – objetivando “integrar teoria e prática no seu decorrer, posto que os currículos nacionais de história no ensino superior têm tentado assegurar o exercício investigativo calcado no uso das fontes diversas tais como os monumentos, estatuárias funerárias, manuscritos, documentação impressa, anúncios, iconografias, paisagens, logradouros etc.”

Pela magnitude de um curso dessa natureza é possivel que este projeto da Faculdade de História ainda esteja sendo desenvolvido para este público-alvo com presença na sala de aula efetiva em todas as classes do ensino médio estadual. Mas, se por um lado há a motivação para o uso do aporte metodológico no repasse dos temas, certamente há, também, a abrangência dos materiais conteudísticos motivando a inscrição dos fatos da história regional para o aprendizado nesse tempo escolar. Contudo, pelos emails que recebi depois dos textos publicados neste jornal sobre a crise de 1935 e Magalhães Barata no Pará, percebi a ausência de informação sobre essa parte da história paraense.

Testemunhei, há anos passados, um afilhado meu chegando em casa com seus afazeres escolares do ensino fundamental constando um item que solicitava os nomes de personalidades da política no Pará. O jovem desconhecia os mais antigos e só reconhecia os então governadores e parlamentares. Esses nomes foram registrados e aceitos todos pela professora. Ao avaliar o C (certo) que recebeu na questão, perguntei-lhe quem eram e o que haviam feito. Ele não sabia.

Se personagens e fatos representativos da política paraense do passado são desconhecidos pelos alunos de ensino médio e/ou por universitários, não se dá o mesmo sobre as figuras que frequentam a mídia, a exemplo, os que se apresentam nas sessões de CPMIs. De Carlinhos Cachoeira a Durval de tal & sequência de tipos acusados por práticas de corrupção são conhecidos tanto dos episódios que os envolveram como das tranças que marcam a presença destes na mídia (principalmente a televisiva e as redes sociais). Quem acusou, quais ferramentas foram usadas para a acusação, o que responderam e etecetera & tal são parte da noticia que recolhem (quando o fazem) para uma contestação opinativa, sem nenhum fundamento mais substancial (origem, motivos, jogo no poder). Revelam, então, a reprodução que a midia oferece em torno da evidência dos fatos, da culpa e julgamento sumário dessas figuras. Não se verifica um conhecimento consistente da ocorrência que levou a esses eventos. Há um principio maniqueista a acelerar idéias, tombadas em tendências partidárias.

Retorna-se então ao dilema do conhecimento da história, passada e recente. Se no primeiro caso meninos e meninas do ensino médio revelam carências acentuadas sobre acontecimentos que marcaram o Pará em fases do sistema republicano é porque o exercicio da indução ao conhecimento desses eventos não teve importância crucial. Perde-se o momento de definir e conhecer esses fatos para evidenciar o que é verídico e o que é mitológico articulado a diversos saberes da área das Ciências Humanas. Pergunta-se: o que vem sendo discutido no campo acadêmico tem sido aplicado nas escolas, pelos professores, sabendo-se que nesse campo há estudos focais sobre a história paraense? E se isto ocorre de que forma vem sendo disseminado pelo conteúdo programático das disciplinas?


sexta-feira, 8 de junho de 2012

NOS MEANDROS DO PODER





Prosseguindo no enfoque sobre a crise de 1935, com a não indicação de Magalhães Barata ao governo do Pará, dois pontos precisam de atenção. Primeiramente, quero deixar claro que os estudos que fiz nos anos 1988-1990 para a dissertação de mestrado defendida no NAEA (1990) sobre a história política no Pará nas duas primeiras fases republicanas tiveram como fontes os jornais paraenses do século XIX e XX (Folha do Norte, Estado do Pará, Diário do Estado, O Imparcial, A Provincia do Pará, este até o incêndio, e outros) de notíciário e entrevistas de líderes políticos da época (Abel Chermont, Barata). Da literatura regional manuseada destaquei, entre outros, Creso Coimbra (1981), Marilia Emmi (1987), Carlos Rocque (1981; 1983), Denise Rodrigues (1979), Lindolfo Mesquita (1944), Octávio Meira (1971; 1975). Na literatura nacional, os autores ratificavam os fatos relatados por seus congêneres paraenses. Houve sessão de depoimentos como o do jornalista João Malato, de Carlos Rocque entre outros. Essas fontes dimensionaram a pesquisa sendo elementos necessários ao trabalho científico.

Em segundo lugar, analiso as ocorrências sobre os fatos de 5 de abril usando a teoria gramsciana que trata de bloco histórico. Reexamino a atitude do TRE ao desconsiderar a eleição indireta de Barata, sendo nomeado interventor o Major Carneiro de Mendonça, diplomando-se Mário Chermont como deputado federal e Abel, senador, cargos para os quais haviam sido eleitos ao Congresso do Estado em 1934. Quanto a Magalhães Barata foi servir numa unidade militar de Ipamery(GO).

Da atitude dos deputados liberais que dissentiram das ordens de Barata e coligaram com a oposição, ficaram duas perguntas cuja argumentação histórica criou grupos: uns dizendo que houve traição, outros que houve dissidência.

       Para os aliados de Magalhães Barata, a postura dos dois primos Abel e Mário Chermont foi tratada como traição. Argumentam com base em indícios morais, pessoais e políticos como reforço à denúncia da atitude.

Por outro lado, os aliados dos Chermont se defenderam da acusação denunciando abusos de poder praticados pelo Interventor e a dúvida que os assaltara se este cumpriria a palavra empenhada com os correligionários, na distribuição dos cargos a serem preenchidos por Abel(senatoria), com mandato de oito anos, e Mário(parlamentar), com mandato de quatro. Os fatos ocorridos com Genaro, Abguar e Acylino comprometiam a palavra do Interventor. Num manifesto que fez publicar no "O Estado do Pará", em 9 de abril de 1935, Abel Chermont nega o argumento de traição, remetendo à Barata, a culpa, e aponta os motivos que o levaram a dissentir, representando as estratégias montadas pelo Interventor para alijá-los do poder e transformar o Partido Liberal numa facção de caráter doméstico, comandado por seu cunhado, Aníbal Duarte. Denuncia a criação da Concentração Magalhães Barata como "arma para matar o PL", sendo, este argumento, o mais forte para justificar o motivo principal da coalizão com a FUP. Abel Chermont vê a prática política de Magalhães Barata desvirtuada do ideário revolucionário, procurando montar uma "política doméstica" e aponta para a sua própria isenção, tendo por base a "salvação" desse ideário cuja expressão era o fortalecimento do Partido Liberal que Barata pretendia aniquilar sobrepondo a Concentração Política.

Identifica-se, no conflito surgido entre os dirigentes do Partido Liberal, uma crise hegemônica do bloco histórico (Gramsci). Na aparência dos fatos sobressai uma crise pessoal, quase doméstica (levando-se em conta o grau de parentesco de alguns contendores), que identifica um “ato de traição". Entretanto, os elementos subjacentes da crise hegemônica não podem ser procurados no momento da ruptura, mas em fatos anteriores que pudessem estar contribuindo para a ação final. É sintoma da construção desse momento os rompimentos entre os revolucionários de 1930, desde os primeiros meses, os cortes do poder das lideranças emergentes impostas pelo Interventor e organizadas em torno dele, a arregimentação de grupos de interesse (magistério feminino) e grupos de pressão ("batalhões patrióticos"), a supervisão do poder do magistério nas escolas, através do incentivo às práticas "cívicas"; incorporação de outros grupos de interesse no séquito de apoio (maçonaria, operários). Na medida em que o Interventor Magalhães Barata construía seu poder pessoal, no conjunto da sociedade civil, fortalecia também, um grupo de apoio dentro do próprio Partido Liberal, instituição onde transitavam outros membros da classe dominante, também interessados em manter e defender sua predominância social e política. Ocorre que o Interventor tinha construído as bases ideológicas de um discurso populista, arregimentando as massas populares para, no momento aprazado, poder influir com maior peso do que o adversário, seus companheiros de partido que pertenciam à elite. Ele tinha o poder do Estado, mas não contava com a possibilidade de uma aliança de classes, a saída que tinham os Chermont para fraturar o poder do Interventor. A coalizão realizada entre os dissidentes do PL e os membros da FUP fortalecendo a elite decaída e fraturando as resistências dos grupos de pressão através de medidas legais que afastaram as possibilidades de interposição de coerção aos aparelhos de Estado, ainda nas mãos do Interventor, contribuíram para o desfecho violento que sacudiu a cidade de Belém, na tarde do dia 5 de abril de 1935.

Houve, portanto, dissidência de uma parte dos membros da classe dominante que percebeu seu alijamento da organização partidária, instituição onde se expressava o seu poder de classe.


sábado, 2 de junho de 2012

MAGALHAES BARATA E A CRISE DE 1935

Magalhães Barata , Interventor do Pará nos anos 1930-1934

Hoje, 2 de junho, comemora-se o aniversário de Magalhães Barata, um líder que criou poder e carisma no Pará. Fiz estudos sobre seu governo de 1930 a 1937. Contribuindo com a informação sobre essa história, recortei partes desse estudo, em vias de publicação.

O primeiro quadriênio da Interventoria de Magalhães Barata (1930-1934) é o período de reforço ao poder de novos grupos econômicos, embora o ideário revolucionário liberal pretenda demolir as oligarquias dominantes.

O nepotismo é uma articulação de Barata durante este período: Alberto Engelhard era primo do Interventor e ocupava o cargo de Diretor da Recebedoria de Rendas. O prefeito de Belém, Ildefonso Almeida e João Ferreira Baltazar, fiel do tesouro, eram seus primos. Seu irmão, Mário Barata, fora indicado a concorrer a uma vaga para a constituinte estadual, nas eleições de 1934.

As fraturas do bloco no poder dão-se logo no início da Interventoria e apresentam variados motivos. Conjugam-se questões de melindres pessoais às formas de mando autoritário do interventor, correligionários são expulsos, os novos adesistas mantém certa mobilidade entre os membros partidários. A liderança do Partido Liberal (PL) é dividida entre Magalhães Barata e Abel Chermont, com o acordo firmado entre os revolucionários de 1930 estabelecendo que o comando do partido seria de responsabilidade deste ultimo, enquanto as decisões do governo seriam exclusivas de Barata. Grupos se formaram em torno destas duas figuras, evidenciados no final do pleito de 1934. Nesse período, a oposição aglutinada na Frente Única Paraense (FUP) incorpora antigos oligarcas.

O fortalecimento da liderança de Barata integra-se a uma estratégia de dominação assentada em bases horizontais, justificando o interesse em agregar várias categorias profissionais. Logo após as eleições de 1934 criam-se associações cívicas nos bairros da cidade, os "batalhões patrióticos". Em outubro desse ano surge, na Pedreira, a associação cívica PODER, constituída de operários e trabalhadores residentes nesse bairro. O programa do grupo estabelecia o "franco apoio ao regime revolucionário, especialmente ao governo do Major Magalhães Barata". A associação instala delegações em vários pontos da cidade. Cerca de um mês depois, surge a Concentração Política Magalhães Barata, originária da Associação Aliança Patriótica. Cria sucursais em todos os bairros e tem um programa de ação "cívico e político, procurando agremiar, em torno do governo" do Interventor, "o maior número possível de adeptos". O presidente de honra da Concentração é o cunhado de Barata e deputado eleito pelo Partido Liberal(PL), o baiano Aníbal Duarte.

O crescimento e fortalecimento dessa Concentração deixa apreensivo o chefe do PL, Abel Chermont, que ao ver ameaçada a sua liderança, passa a questionar o paralelismo da ação e a articulação popular dessa agremiação, criticando-a publicamente. Com isso, enfraquece o relacionamento dos dois chefes políticos, embora nenhum deles admitisse diante da imprensa.

Em dezembro de 1934, uma crise interna estremeceu as bases do partido, motivada pela pretensão do Interventor em impor a renúncia ao mandato de um dos três deputados federais recém-eleitos - Abguar Bastos, Genaro Ponte Souza e/ou Acylino de Leão – com a vaga devendo ser assumida pelo seu irmão, Mário Barata, que ficara na 1ª suplência. Alegava que o mandato pertencia ao partido e não ao eleito. A reação dos três foi negar-se a satisfazer as ordens recebidas. A contrarreação implicou no tiroteio à casa de Abguar Bastos e invasão à residência de outro deputado federal, Luís Pingarilho, onde se homiziara Genaro Ponte Souza, sequestrado e sofrendo violências morais e físicas, tendo a cabeça raspada a gilete. Genaro, Acylino e Abguar saem do partido situacionista.

Estes incidentes que levaram à fratura do PL fortaleceu o interesse da oposição, em aproveitar-se da situação para interferir na não indicação de Magalhães Barata ao governo do Estado. Esse grupo indicaria Mário Chermont para o governo. Abel, senador, relutava, queria uma reconciliação com Barata, atitude considerada por Mário um "suicídio político", preferindo, ao invés disso, a composição com a FUP. Abel cedeu às pressões, condicionando sua atitude à candidatura do primo.

O desfecho da crise desenrola-se em 4 de abril de 1935, data da eleição indireta de Barata pelo Congresso Estadual, ao governo constitucional do Estado. As articulações mantidas secretamente pela oposição com Mário e Abel Chermont, desde janeiro desse ano, favoreceram a cooptação de sete deputados do PL representantes do grupo abelista e asilados no Comando da 8ª Região Militar, juntamente com os nove membros eleitos da FUP. Esta passou então a ter a maioria do quorum, podendo indicar quem quisesse para o cargo.

Mas os  deputados liberais fiéis a Magalhães Barata preencheram as vacâncias com os suplentes dos dissidentes e, na sessão da Assembléia, onde se daria a eleição, completam a maioria absoluta. Elegem Magalhães Barata para o cargo de governador e Ápio Medrado e Fenelón Perdigão como senadores. Houve recursos aos tribunais eleitorais estes declarando nula a eleição realizada sem o grupo dissidente.

Em 5 de abril, os deputados asilados tentaram sair do Quartel General  protegidos por habeas corpus concedido pelo TRE, mas isso não foi possivel, ocorrendo um violento conflito entre as forças do Exército que protegiam os dissidentes e membros da Concentração Política Magalhães Barata, colocada  em  pontos estratégicos da Praça da Bandeira. Houve feridos e mortos. Alguns dos deputados dissidentes foram hospitalizados. Foi nomeado imediatamente um novo Interventor federal, Major Carneiro de Mendonça. O nome de Mário Chermont foi afastado, continuando ele como deputado estadual e Abel como senador, cargos para os quais haviam sido eleitos ao Congresso do Estado em 1934. Quanto a Magalhães Barata não foi indicado e perdeu o cargo para o qual lutara tenazmente, embora usando a força para eliminar seus opositores.