domingo, 7 de julho de 2013

PARTIDOS ENVELHECIDOS



Nas recentes manifestações de rua no país uma grita sistemática se mantém insistentemente, em relação a um sentimento antipartido. O descrédito partidário passa pela informação emblemática sobre o não partidarismo dos ativistas e as palavras de ordem solicitando a reestruturação das organizações partidárias e/ou a extinção das mesmas. Sobre este último item não pretendo tratar, haja vista que sou adepta de um sistema democrático republicano e este necessita de um eixo de expressão da sociedade através da representação de um grupo organizado com participação voluntária.
         Mas em relação aos dois primeiros itens considero procedentes e me animo a argumentar trazendo para exposição uma entrevista do cientista político Jairo Nicolau (UFRJ, orientador de minha tese de doutorado/IUPERJ), matéria de Flavio Tabak, publicado no Jornal “O Globo”, de 19/06 do corrente. No final, há, também, partes de um texto da filósofa Marilena Chauí que em sua análise revela o histórico de outras lutas sociais que não se acham na memória atual dos manifestantes. Me ative a questão deste debate.

Ao ser indagado sobre o que tem contribuído para o afastamento partidário da juventude, diz Nicolau: “Não conheço pesquisas sistemáticas, mas observo já há algum tempo que os partidos brasileiros envelheceram. Não estou falando só pelo fato de os dirigentes terem ficado mais velhos. Algumas legendas até fizeram renovação. Não é isso. Falo do envelhecimento no sentido de cooptar jovens para a militância partidária”.

Jairo enfatiza que o surgimento de novos movimentos sociais, nos anos 1980, quer fossem ambientalistas, de gênero, pacifistas, além de outros mecanismos de interação política em nível mundial e nacional trouxe uma reorganização no estilo de vida politica haja vista que até então eram somente os sindicatos e os partidos que se integravam nessas ações. Nesse caso, a natureza dos partidos foi intentando adequações como quando a reorganização da sua exposição pública se tornou necessária pela queda de um dos bastiões dessa evidência que eram os comícios. Não pela ausência de jovens, mas porque não só os custos eram altos, perderam a valorização e as pessoas deixaram de ir, pois, no caso das campanhas eleitorais, novas formas de exposição centraram-se na TV. Jairo diz que nesse período no Brasil, a juventude explode em participação nas hostes petistas, com “essa energia para a vida partidária brasileira de forma muito potente, com estética diferente, jovens de classe média, artistas”.

Para Nicolau, a nova lei dos partidos (9.096, de 19/09/1995) trouxe mudanças internas para essas organizações, com o sistema partidário brasileiro tornando-se muito dependente do Estado, em todas as dimensões. Uma delas, se não a principal, é referente à constituição do Fundo Partidário (Cap.II, art. 38). “Os partidos brasileiros ficaram acomodados, estatizados com quadros pagos com recursos da patronagem, dos militantes no poder, ministros, secretários, assessores. Em geral, os partidos estão dominados por profissionais.”

Quanto ao apartidarismo da juventude, não quer dizer que eles não se interessem pela política. Na versão de Jairo houve um deslocamento do interesse dessa geração pela política que não inclui “acompanhar a vida partidária”. A desvalorização do partido político pelo formato apresentado no processo de corrupção das lideranças no poder constrói outras agendas de demandas que reforçam itens de indignação importantíssimos abrangendo, por exemplo, recursos gastos nas obras da Copa, serviços públicos sucateados, custo de vida, além de “sentimento difuso contra a elite política”. Esse ativismo juvenil explora “um sentimento antipolítica tradicional que estava no ar”, diz.

O resultado de uma enquete com aplicação de formulários que Nicolau realizou entre seus alunos do quinto período de Ciências Sociais da UFRJ, mostrou que “apenas um tinha simpatia pelo PSOL. Os outros não declararam simpatia por partido algum e 30% se classificaram como de direita. Claro que ainda há muita militância, mas não com partidos, que não têm uma grande atratividade para esses jovens.”

As observações de Jairo Nicolau levam a um nível de reflexão em especial aos líderes partidários tanto os que comandam os partidos considerados tradicionais quanto aqueles que estão esperando vez para serem criados. O que está sendo posto pelas manifestações de rua deve ser considerado como um aspecto a mais da insatisfação de tantos.

Há, também, uma análise interessantíssima de Marilena Chauí (no blog http//midiafazmal.wordpress.com) sobre alguns pontos das manifestações de rua. Considera um histórico dessa forma de ativismo no Brasil (que hoje a mídia injeta desconhecimento sobre essas ações) e ao tratar do “pensamento mágico” evidencia as características da convocação feita pelas redes sociais e alguns problemas apontados pelo uso dessas redes. Nesse demonstrativo posta a crítica que os ativistas estão fazendo às instituições políticas que para ela possui base concreta Como o de o “inferno urbano” ser de “responsabilidade dos partidos políticos governantes”, no plano conjuntural. No plano estrutural acrescenta: “no Brasil, sociedade autoritária e excludente, os partidos políticos tendem a ser clubes privados de oligarquias locais, que usam o público para seus interesses privados; a qualidade dos legislativos nos três níveis é a mais baixa possível e a corrupção é estrutural; como consequência, a relação de representação não se concretiza porque vigoram relações de favor, clientela, tutela e cooptação”. Argumenta que uma parte dos manifestantes nega legitimidade ao partido político como instituição republicana e democrática e deixa de lutar por uma reforma política.

É o momento de rever posições no percurso das manifestações e não “ir na onda” de que “os partidos são corruptos por essência”.

(Texto originalmente publicado em "O Liberal"/PA, de 05/07/2013)
 

 


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