Antes do advento da TV e dos meios de pesquisa de opinião pública, o relacionamento dos candidatos (raras candidatas) a cargos eletivos com os eleitores era feito através dos comícios em praça pública, do rádio e dos jornais.
No rádio, os marqueteiros da época, exibiam as suas qualidades de compositores e produziam músicas para cada concorrente. Nos jornais já havia a exibição da arte gráfica, embora o que mais chamasse a atenção fossem as entrevistas e reportagens tendenciosas (dependendo da cor política do periódico) com assertivas sobre aspectos da vida dos conpetidores políticos. E os comícios levavam às ruas centenas de curiosos (muito mais curiosos do que propriamente eleitores). A produção desses eventos transformava os discursos de palanques em festa popular, com direito a bandas de música ou, simplesmente, a presença de cantores e conjuntos musicais ligados ao “show business” onde eram propagadas as qualidades dos que a eles eram simpáticos ou mantidos através de cachês expressivos.
As marchinhas e sambas ligados aos postulantes dos principais cargos majoritários chegaram a ser memorizadas. Como a da campanha de Janio Quadros à presidência da república, apoiando-se no ícone anti-corrupção criado para isso: “-Varre, varre vassourinha/ varre, varre a bandalheira/que o povo já está cansado/de sofrer dessa maneira..” E no plano local o que se compôs para a eleição ao cargo majoritário de Magalhães Barata em 1950: “Magalhães Barata/pelo povo/por você,/ Magalhães Barata quer dizer/vitória/vitória do PSD...” Ou de Epilogo de Campos (CDP): “Dr. Epilogo/o Senhor vem completar/esse rol de coisas boas que nós temos no Pará.(...)”
Há casos em que a música surgia espontânea, sem ligação direta com o pleito eleitoral. É o caso da marchinha de Haroldo Lobo e Marino Pinto, “Retrato do Velho”, saudando a volta de Getulio Vargas ao cenário da política, após cinco anos exilado em São Borja (ITU-RS). O carnaval se apropriou da sua imagem e, pela voz de Francisco Alves (o intérprete), o povo repetia os versos e cantava: “Bota o retrato do velho outra vez/bota no mesmo lugar (...) o sorriso do velhinho faz a gente trabalhar...” Diz Flanklin Martins : “.... virou o slogan da volta de Getúlio a Presidência da República, numa campanha em que ele bateu com facilidade o brigadeiro Eduardo Gomes, mais uma vez lançado candidato pela UDN, e Cristiano Machado, lançado e cristianizado pelo PSD”. (...) Getulio ganhou fácil. Teve 48,7% dos votos, contra 29,6% dados ao Brigadeiro e 21,5% a Cristiano Machado.” (http://www.franklinmartins.com.br).
Quanto aos comícios, a presença nos palanques em lugares públicos quando ampliada ou em salões de clubes em reuniões restritas, era o modo de o eleitorada ver a imagem de seu candidato. Ou melhor, avaliar e escolher o concorrente a quem daria o seu voto, mediante a fisionomia e não só a oratória e, quando oportuno, a foto no jornal. Por isso havia toda uma “mise-en-scène” para apresentar o líder partidário de maior evidência ao eleitor. E tantas vezes a este se apegavam elementos mais ligados a determinado grupo (desde a época dos “coronéis” de pequenas comunidades) abraçando-os nos palanques como se fossem (e nem sempre eram) velhos amigos.
Hoje, a nova tecnologia de mídia tem dispensado muitos elementos do velho instrumental de campanha. Os índices da pesquisa de opinião, os debates televisivos, as entrevistas ao vivo, os programas eleitorais obrigatórios expoem os/as candidatos/as e suas campanhas a um amplo cenário. Por outro lado, o senso crítico do novo eleitorado passou a ter mais chance de se tornar acurado, possibilitando-lhe filtrar as qualidades e os defeitos de um contingente significativo de aspirantes aos cargos eletivos, tanto majoritários quanto proporcionais. A exigência de uma postura mais comprometida com o que cada um/a considera ser “política” tem criado uma reviravolta nas decisões do voto. Tornou-se mais difícil desconhecer programas e projetos que o/a candidato/a em seus “discursos” nos microblogs ou no horário eleitoral gratuito diz ter para o desenvolvimento social caso seja eleito. O interessante é a interatividade entre estes candidatos que estão preocupados em mostrar o capital social acumulado para assumir o cargo pretendido e as assertivas do eleitorado sobre a questão. Percorrendo o que está à disposição no mundo digital, o/a internauta se depara com um quadro interessante de “anônimos” respondentes, alguns agressivos, outros insólitos, outros aulicos e ainda outros com um palavreado chulo. Observa-se muitas vezes a “cara” da militância partidária de alguns, mas, na verdade, há um rito geral de ressalvas sobre a política eleitoral. Esse fato, a meu ver, evidencia um grau de interesse pela política aos que se dizem “apolíticos”. E esta é uma das qualidades da democracia na sua fase contemprânea: cada vez mais é possível desmascarar alguns atores em cena.
(Publicado em "O Liberal" em 02/09/2010)
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