Setenta e oito anos nos separam da aprovação legal do direito do voto feminino no Brasil. Um histórico constrangedor definiu o cerceamento desse direito embora as mulheres entrassem na luta desde 1891, para que fossem tratadas em nivel de igualdade nesse estatuto de cidadania política. Isto não quer dizer que muito antes elas deixassem de se insurgir contra outras arbitrariedades quer nas relações de trabalho, quer na sua entrada nas escolas, ou procurando denunciar que os valores tradicionais que circulavam na sociedade mais ampla colidiam com a aspiração de serem tratadas como cidadãs de primeira categoria.
Ao longo desse tempo em que a participação política ampla fortaleceu a insurgência dos grupos sociais e identitários que eram excluidos dos direitos sociais, políticos e civis, as mulheres, enfrentando a dupla jornada de trabalho, criaram uma terceira via de atividade e questionaram a ausência de sua representatividade nos parlamentos e em espaços de decisão, além de outras áreas em que a democracia eleitoral enfatizava o jogo de poder político.
Com o processo de ampliação do eleitorado, ruptura de regras eleitorais que inibiam a participação feminina na competição por cargos parlamentares houve avanço no número de mulheres que se dispunham a concorrer nas eleições. Num estudo que fiz em 2004 com levantamento dos números absolutos e percentuais de candidaturas e eleitos/as em nivel de Brasil, desde 1946 até 2002, para os dois cargos (CD e AL) vê-se a evolução do número de mulheres nesses espaços parlamentares, inicialmente inexpressivos. Em 1946, por exemplo, de um total de 1.675 (98,9%) candidatos para a Câmara de Deputados, somente 18 mulheres, ou seja, 1.1% se dispôs a concorrer. Nenhuma foi eleita nesse ano.
Para as Assembléias Legislativas, as eleições ocoreram somente em 1947, o total de candidatos era de 1.343 (99.4) incluindo-se 8 (0.6)mulheres e destas sendo eleitas. A publicação integral e cronológica desse quadro daria uma posição significativa da evolução de candidaturas femininas e eleitas ao longo destes quase oitenta anos de competição eleitoral entre as mulheres.
As marchas e contramarchas do regime político brasileiro mostravam certa incipiência da presença das mulheres nesses cargos. O mundo todo sofria essa dificuldade de inclusão. Conforme estudos da Inter-Parliamentary Union (IPU) as atividades parlamentares entre os países aumentaram desde o fim da Segunda Guerra Mundial. De 26 parlamentos em 1945 para 187 em 2005, o crescimento da representação feminina ampliou-se de 3% para 16,2% de deputadas, respectivamente, crescimento vitalizado com a realização da IV Conferência Mundial sobre a mulher, em Pequim, em 1995, que investiu nas políticas de empoderamento desse gênero.
É nesse ano, no Brasil, que a legislação eleitoral 9.100/95 ao estabelecer “normas para a realização das eleições municipais de 3 de outubro de 1996”, fez vigorar a lei de cotas dispondo um percentual de 20% a ser destinado às candidaturas partidárias femininas nas eleições proporcionais, em âmbito municipal.
Com a Lei 9.504/97, as cotas partidárias adquirem conteúdo universal, ao prever a destinação de no mínimo 30% e no máximo 70% para as candidaturas de ambos os sexos às eleições proporcionais nos três ambitos - municipal estadual e federal. Um dispositivo transitório para as eleições de 1998 considerou os percentuais de 25 e de 75%, respectivamente.
Em 2009, uma Comissão Tripartite formada por representantes do executivo, do parlamento e membros da sociedade civil, se propôs a intervir nos debates que ocorriam no Congresso Nacional, no momento da discussão da mini-reforma eleitoral. Debates sobre pontos focais da questão levaram à aprovação da Lei 12.034/2009, incluídos os artigos beneficiários para o aumento do número de mulheres no parlamento como: “alteração do artigo que regulamente as cotas, com a obrigatoriedade do preenchimento das vagas, e não mais apenas uma reserva; a obrigatoriedade de utilização de no mínimo 5% dos recursos do Fundo Partidário para a promoção da participação política das mulheres; e reserva de pelo menos 10% da propaganda partidária gratuita para as mulheres dos partidos políticos” (Relatório, p. 3).
O resultado deste novo evento legal sobre as cotas de gênero que antes dava ao TSE uma equação pouco rígida à obrigatoriedade de punição aos partidos políticos, favoreceu outro olhar para as candidaturas femininas. O fato do não preenchimento do mínimo legal nestas eleições/2010 levou o Ministério Público Federal (MPF) a denunciar partidos e coligações que não preencheram o percentual mínimo de vagas para candidaturas de mulheres, sendo julgados e deferidos pelo TSE todos os recursos, determinando que a legislação devesse ser cumprida. Para o Procurador do TRE/PA Daniel Avelino: “A decisão do TSE mostra que a posição do MPF está certa: esse percentual mínimo deve ser retirado do número de candidatos que o partido realmente apresentar, sendo calculado não sobre o número máximo de candidatos que se pode registrar, mas sim sobre os efetivamente registrados”. Assim, em nosso Estado, devem atender à determinação para garantir percentual mínimo de candidaturas de mulheres, os seguintes os partidos e coligações: Coligação Cresce Pará (PRB/PDT/PSB/PV/ PC do B); Coligação Por um Pará Mais Unido (PTN, PSC, PTC, PT do B); Coligação PPS/PSDC/PMN/PRTB/PRP; e PR; PDT, PRB, PSOL, PSB e PTB.
Como se vê, o termo preencher conseguiu reverter cálculos partidários e normas da justiça eleioral que definiam o modo como deveria ser calculada a reserva de vagas.
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