domingo, 1 de fevereiro de 2015

MISCELÂNEA


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É o dominio da palavra que leva as pessoas a ousarem mais. No balbuciar, o reflexo da insuficiência de um vocabulário que atue na comunicação e a ausencia de certos conhecimentos interfere na lógica de se pronunciar sobre qualquer coisa, salvo se há ousadia de mostrar a presença naquela ação. A criancinha que caminha no processo de aprender, tende a apreender dos seus mais próximos, tanto os gestuais como as palavras que são faladas para si e para os outros, dos conviventes que lhe asseguram o contato com o mundo. Hoje em dia, com o avanço de pesquisas, diz-se que o feto se estimula com os sons que ouve no ventre da mãe. Já presenciei mulheres grávidas dando ao seu rebento preste a nascer, um tempo de música clássica, não só para manter certa suavidade no enlace de momentos, mas, dizem, principalmente, para estes se inserirem no gosto por esse gênero musical. Novidades sempre ocorrem nesse estágio de entendimento sobre o ser no mundo e assim, o avanço da aquisição de conhecimentos leva os preocupados com o futuro dos filhos e filhas a incorporarem em seus comportamentos o que a ciência registra como o melhor para o ser humano.
Com a contemporaneidade vencendo o processo civilizatório em pesquisas permanentes sendo estas divulgadas sem que haja, por vezes, um tempo de amadurecimento sobre os resultados desses achados, vê-se uma amplitude de experiências consideradas saudáveis e aplicadas tal qual são noticiadas. Da ingestão frequente do café – que antes era salutar e se tornou inimigo da alimentação retornando, posteriormente, com outras insignes terapias e novamente marcando pontos negativos aos viciados nessa bebida – à profusão de frutas tendentes à cura desta ou daquela doença ou mal estar, com receitas caseiras favoráveis ao aumento ou diminuição de peso corporal, segundo o interesse nas dietas de engorda ou emagrecimento, o bombardeio noticioso quebrou as barreiras do ontem e o instante faz agora o processo real se tornar efetivo.
Mas quando a noticia se faz em relação à situação moral das pessoas, o fruto da disseminação desses casos vai além do comentário insidioso sobre o sujeito da ocorrência. Torna-se fofoca, ou seja, um dito maldoso, um mexerico, um disse-me-disse que tem sido causa de bulling (assédio moral e físico de um/uns contra outro/s) chegando ao climax de um ato suicida de quem foi o centro da falta de lealdade.
No âmbito da prática política as insinuações maldosas contra alguém são parte do processo de oposição e por vezes aversão sobre quem é contrário à ideologia do outro. Se a pesquisa de saberes e conhecimento científico é salutar para reaver as realidades passadas e demonstrar as novas posições de determinada assertiva da primeira hora da investigação, o rito maldoso contra alguém tem resquicios cujos resíduos jamais perderão o tom daquele dito provocante. Vê-se, por exemplo, na situação das relações de gênero em que homens e mulheres tiveram seu tipo sexual moldado em representações sociais sob a dominação de contextos hierarquizados pelas normas que definiam/definem a inferioridade feminina e a superioridade masculina. Até hoje as mulheres lutam para demonstrar sua inteligência em todas as áreas sociais e do conhecimento enquanto os seus parceiros seguem as normas reguladoras de procedimentos que se tornam princípios formais com preceitos estabelecidos em qualquer posição que se insiram haja vista que a tradição e os valores socioculturais tendem a privilegiar para eles o status herdado na ancestralidade patriarcal. Desde os mitos – o de Adão e Eva, por exemplo – ao plano atual comportamental, insinua-se a imagem feminina destratada moralmente. Eva foi criada depois de Adão que emprestou uma costela para torna-la ser vivente pelas mãos do Senhor. Eva teria insuflado seu parceiro a “comer o fruto proibido da árvore da ciência”, consequentemente, além da maldição de que geraria com dor aos filhos que parisse, o mais cruel foi a culpabilidade em ter sido a incitadora do pecado levando toda a humanidade a ser privada da perfeição e da perspectiva de vida eterna. Na sequencia das insinuações à figura feminina pecadora, a mulher foi submetida a muitas outras hostilidades gerando situações de violência contra ela. E até hoje as leis da justiça humana caminham na agenda das lutas pela conquista de novos olhares sobre elas para sanear esses principios hostis que a submeteram originalmente.
Procurando despojar-se das máscaras discriminadoras, o percurso submeteu-as às várias condições ideológicas que circulavam socialmente. Na teoria liberal e democrática, por exemplo, acharam as primeiras justificativas para questionarem os direitos desiguais. O voto se tornaria o “leit motiv” para pleitearem a cidadania escancarada nas doutrinas políticas, mas não as atingindo. Locke, Rousseau e os utilitaristas haviam modelado um mundo no qual os homens podiam ser livres e iguais, uma sociedade civil na qual os homens determinariam os seus próprios destinos. (...) John Locke e outros filósofos, que argumentavam contra o poder absoluto do rei e a favor de relações contratuais livres entre homens, não incluíam mulheres como participantes da sociedade civil.” (Andrea Nye, 199, p. 15). Entretanto, a presença de reformadoras como Mary Wollstonecraft e Harriet Taylor foi definitiva para enfrentar essas idéias e desmontar os paradigmas.
Ao circularmos nas redes sociais, em específico, o facebook, vê-se um turbilhão de idéias, ditos, verbetes, compartilhamentos de noticiário de midia nacional e internacional, opiniões pessoais, dos outros, serviços de utilidade pública, aniversários, casamentos, referência a relacionamentos construidos no estilo “sério”, preces, imagens as mais diversas de pessoas a insetos, eventos e tantos e tantos estilhaços de fatos das vivências particulares (pessoas) e coletivas (grupos), percebendo-se, então, o apresamento das representações sociais formando uma miscelânea de imagens construidas. Algumas mantêm o status quo ante. Outras revelam ousadias no enfrentamento às velhas tradições.

(Texto originalmente publicado em "O Liberal"/Pa de 30/01/2015) 



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