sábado, 12 de janeiro de 2013

O ANIVERSÁRIO DE BELÉM


O que temos para festejar neste aniversário de Belém?

         Belém foi a cidade que me acolheu desde os 12 anos, quando fui matriculada e frequentei um colégio de freiras para continuar meus estudos deixando a minha cidade natal que ainda não dispunha desses avanços escolares. Hoje, há maiores facilidades porque existem escolas de ensino médio em todas as cidades paraenses. Antes, os pais que tinham posses, inscreviam seus filhos e filhas nos colégios da capital. Alguns eram hospedados em casa de parentes, outros, sem essa facilidade, tinham que arcar com recursos próprios para que os jovens ficassem internos em colégios particulares. Havia os semi-internatos, casas familiares que recebiam jovens interioranos.
         Desde pré-adolescente reconheci esta cidade como o espaço que me daria uma formação aspirada pelos meus pais, e nessa trajetória, os anos se passando, a aclimatação me deu oportunidade de convivio com a geografia do território onde as letras do saber mais apurado iam se acumulando e o reconhecimento sobre o cotidiano se tornava mais um ponto a dividir, em períodos de férias, com os familiares e/ou os amigos interioranos.
          É desse tempo que suponho ter passado a amar esta cidade que mais tarde se tornou o berço das minhas filhas e hoje, de netos/as e, neste ano, de um/a bisneto/a. O deslocamento residencial circunstancial entre os bairros belenenses definiu o meu entendimento sobre as políticas urbanas que se faziam de forma diferenciada reconhecendo o que era centro, médio-centro, periferia e vilas-satélites. A convivência, desde a adolescência, com essas comunidades, mostrava-me a circunscrição habitacional revelando-se áreas de moradia, de comércio, de feiras, de acumulação do lixo que era recolhido e levado para o forno cremátorio (hoje desativado), um local do bairro objetivamente chamado de Cremação criado na administração do Intendente Municipal Antonio Lemos  como medida de saneamento. Os lugares públicos como as praças ficavam sempre nas áreas do centro da cidade, efeito ainda desse processo de urbanização lemista. Casas edificadas de tipos semelhantes às imagens de residências européias mostravam o garbo de um passado que teria sido de grande riqueza e empenhado nos emblemas de títulos como o de “Metrópole da Amazônia" ou de "Cidade das Mangueiras".
            Deslocando minha trajetória escolar de uma fase de reconhecimento quase superficial para uma outra agora em nivel de pós-graduação tive acesso à história regional escrita e comentada verbalmente, à documentação sobre as políticas públicas que foram propostas, legisladas e executadas e algumas impostas durante as várias gestões no governo municipal de Belém do princípio do século XX. E desse acúmulo de informações onde o centro da minha questão eram as mulheres na política testemunhei, entre versões sobre os fatos ocorridos em ao menos três períodos histórico-republicanos, os litigios entre “príncipes” da política local que se digladiaram, com alguns arruinados e depostos sendo expulsos da cidade. A crise entre Antonio Lemos e Lauro Sodré e suas “entourages” que levou à deposição e expulsão do primeiro há cem anos (1912) demonstrou ser em decorrência de modos políticos de governar. A denúncia da oposição contra o “velho” Lemos cujo apogeu de mando se dá entre 1904-1909, mas há 15 anos no poder da cidade, se inclinava a considerar que sua gestão se realizava de forma patrimonialista e dirigida às classes sociais altas, as únicas que podiam legitimar a forma de urbanização e promoção da beleza da cidade cujo modelo ele captava do governo Pereira Passos, do RJ, e da influência européia na arquitetura das edificações. Essa denúncia gerenciava a criação de movimentos sociais chamadas de “frentes patrióticas” em forma de ligas intituladas “Liga Moral de Resistência”, “Centro de Resistencia ao Lemismo”, “Clube Democrático Lauro Sodré”, “Liga Feminina Lauro Sodré”, que objetivavam empreender campanhas que solucionassem a chamada "anarquia social", supostamente estabelecidas nacionalmente desde o período de Campos Sales, com a centralização do poder das oligarquias estaduais.
            Com a interventoria de Magalhães Barata, em uma segunda república, a gestão da cidade deu-se entre novos rumos onde as políticas do Programa da Aliança Liberal promoveram medidas de cidadania fortalecendo a base de políticas públicas para a classe operária, por exemplo, cuja situação deixou de ser tratada como “caso de polícia” para ser favorecida como “questão social”. O urbano belenense teve uma nova reconfiguração também, pois, as fábricas foram acompanhadas pelo gestor estadual que tomava para sí os desmandos de pauperização da população e as condições insalubres em que o operariado trabalhava.
             Numa Terceira República, pós-1945, a revalidação das questões sociais valorizou o espaço urbano cuja “desodorização” (termo usado por Nazaré Sarges) deixou de ser somente por uma estética plástica da cidade, mas de atenção a novos espaços de sociabilidade inter-classes sociais. Praças públicas são construidas em bairros períféricos, com a territorialidade estendendo-se para pensar em outros significados ditados pelas políticas públicas que eram exigidas pelos cidadãos, mas, implementadas segundo a vontade política do gestor.
          Hoje, o que pedimos como presente para festejar o aniversário de Belém? Que o novo gestor avalie quais programas políticos ainda estão nas gavetas e, conforme as possibilidades, implante-os, em torno de áreas como educação, saúde, saneamento, segurança e a cultura, um dos ramos mais esquecidos ainda.

(Texto originalmente publicado em "O Liberal"/PA em 11/01/2013)

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