sábado, 17 de dezembro de 2011

A ARQUITETURA DOS DIREITOS HUMANOS



As primeiras menções a direitos humanos unem-se ao que era propagado nos primórdios do cristianismo, aludindo ao que Jesus falou: “amar o proximo como a si mesmo”. O vínculo com a religião criou um fosso no período medieval quando, pelas relações da Igreja e do Estado eram assassinados aqueles que não se coadunavam com os principios de poder que os ministros da chamada cristandade determinavam nesse dominio político, quando os acusados de heresia eram julgados pelo Tribunal eclesiástico responsável por averiguar e julgar esses casos. Nos séculos XVII e XVIII novas correntes de pensamento apartaram essa ação inquisitorial e foi observada a questão dos direitos humanos por culturas especificas e etnias.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas registrou: “Todos os seres humanos nascem livre e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espirito de fraternidade”. Essa afirmação seguiu bem de perto os ensinamentos cristãos, mas o termo “todos” é muito abrangente e dificil de ser constatado. Não é preciso ser cristão para se reconhecer no próximo um igual, mas há uma inspiração utópica, além mesmo do que escreveu Thomas Morus em sua “Utopia”. A verdade é que se em termos antropomórficos as pessoas mantém atributos humanos, espiritualmente elas nem sempre se reconhecem e se respeitam, mesmo que teoricamente saibam que a divergência é muitas vezes encontrada, até porque as idéias não se afinam quando vistas de forma singular: o que um pensa pode diferir do que outro pensa, mas o que se deseja é que a exteriorização de pensamentos antagônicos não levem a conflitos.
Minha geração observou as diversas mudanças que se processaram nos modos de educar e/ ou conviver. Nas primeiras letras havia a “sabatina” e quem errasse uma das quatro perações da aritmética, por exemplo, soma ou uma multiplicação, levava “bolo” (uma palmada com uma peça de madeira com formato especial, provida de um cabo semelhante a uma colher, chamado de palmatória). E não era só em aula de aritmética. O “bolo” cabia em outras disciplinas e servia de complemento a um castigo mais doloroso: a evidência na classe como “burro” ou simplesmente rebelde, valendo castigos que iam da segregação em aposento que muitos chamavam de “quarto escuro” ou até um chapéu em forma de cone com o rótulo correspondente à postura considerada anômala (de “burro/a” a “insubordinado/a”).
Um pouco mais atrás no tempo, as meninas “de familia”(ou não) eram monitoradas por uma série de regras de moral e de postura. Desde o lar, as garotas eram guinadas ao casamento, e os pais estimulavam a relação social de onde surgiria o “partido” ou seja, alguém “de posse” que desse à filha um “bom futuro”. Nossas avós casavam cedo, e nem sempre por amor. O direito da futura “dona de casa” era moldado nos preceitos biblicos da servilidade feminina. O tempo não passava nesta visão de microcosmo.
Quando as meninas já podiam “voar mais alto”e ganhar um curso superior, mesmo assim os direitos teoricamente iguais sofriam socialmente preconceito de gênero. Foi a muito custo que este gênero se emancipou, ou que abraçou a tese de direito humano que já ouvia dizer – ou lia sobre.
As etnias custaram a ser reconhecidas como iguais perante a lei. A escravatura nivelou o ser humano ao animal de carga. Pelo menos era assim que os negros eram vistos pelos senhores que os compravam, especialmente na zona rural do ocidente. E o preconceito não era voltado só ao negro. Em alguns paises do continente americano cabia o termo aos índios e asiaticos. O cinema e a literatura estão cansados de mostrar como as pessoas se tratavam de forma díspare em episódios históricos.
Depois da 2ª.Guerra Mundial, com a criação da ONU,os principais objetivos das Nações Unidas, para “manter a paz, a segurança internacional, desenvolver relações amigáveis entre as nações” foram calcados em realizar a cooperação internacional para resolver problemas econômicos, sociais, intelectuais e humanitários, assim como “desenvolver e encorajar o respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais sem qualquer tipo de distinção”. Este principio norteou a assinatura no dia 10 de Dezembro de 1948, da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Como já se vão 63 anos, pergunta-se se com essas normas houve abrangência de melhor tratamento entre os humanos e eficácia para a aplicação. No plano internacional desrespeita-se especificidades culturais, alimenta-se a cupidez e a consequente intolerância e as guerras prosseguem em setores. No plano nacional e regional superou-se algum preconceito mas ainda existe o mau tratamento a quem deseja expor o que pensa e o respeito que se deve ter às divergencias de pensamento. A linha muito tênue entre a rebeldia e o crime exala um “perfume cultural” que vem de más condições de vida. E estas condições nem sempre são apenas de ordem econômica. Os direitos humanos ainda sobem degraus de uma longa escada . E aí se volta ao principio de tudo, ao que Jesus pregou. O que se pode ver como um “direito espiritual” ainda é o almejado na constatação de que as pessoas não são dieferentes. Todos nascem, vivem, morrem e possuem a mesma arquitetura anatômica. Resta aprender isso.
(Texto originalmente publicado em "O Liberal" em 16/12/2011)

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