sexta-feira, 1 de abril de 2011

O DEFICIT DA IGUALDADE POLÍTICA



O Relatório do Desenvolvimento Humano de 2010, lançado em novembro pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), apresentou estudo do Fórum Econômico Mundial - Verdadeira Riqueza das Nações: Vias para o Desenvolvimento Humano. Esse relatório considerou três medidas inovadoras complementares: o IDH Ajustado à Desigualdade (IDG), o Índice de Desigualdade de Gênero e o Índice de Pobreza Multidimensional. Minha intenção é avaliar o Índice de Desigualdade de Género (IDG) que destaca as diferenças na distribuição das realizações entre mulheres e homens, com enfase na posição do Brasil na representação feminina nos parlamentos.

Sabe-se que a conquista do direito do voto, pelas mulheres – estatuto que lhes garantiria a cidadania política nos primórdios da democracia eleitoral – foi uma ação incansável em nivel mundial e muitas lideranças sofreram prisões, violências físicas e morais (cf. filme “Anjos Rebeldes”, 2004). Mas essas lutas das sufragistas não aspiravam apenas o direito de votar. Esperavam garantir, também, uma representação feminina nas casas legislativas, instâncias de decisão política. Essa história está cheia de marchas, caminhadas, ações e projetos no plano juridico para desmontar as nuances patriarcais e patrimoniais dos “chefes políticos” que definiam quem estaria apto a assumir esses cargos. Estratégias eleitorais variadas sempre forçaram as mulheres a optar por um “outro mundo” com a renovação de ideologias que exploravam os ditos” mulher não gosta de politica”, “as mulheres seguirão as ideias dos maridos ou dos pais na hora de votar” e por ai vai toda a desmontagem do incentivo às aspirações femininas e o reforço ao afastamento desse gênero da política formal (há exceções, obviamente).

Na Conferência de Beijing (1995) foram identificadas 12 áreas críticas como obstáculos a serem eliminados para o avanço social e político das mulheres. E entre as áreas indicadas, incluiu-se à desigualdade de gênero no exercício do poder e na tomada de decisão política nos cargos legislativos e executivos. Ações de enfrentamento aos baixos percentuais de mulheres nos parlamentos nacionais e locais foram implementadas pelos movimentos articulados de mulheres. Seminários procuraram estimular os partidos na escolha de candidaturas femininas e/ou capacitar as cidadãs interessadas na competição eleitoral. Essas estratégias, visando discutir questões e problemas ligados ao poder nas relações de gênero, presentes nas versões culturais que tratavam como desgraça pessoal ou injustiça social as desigualdades sofridas pelas mulheres, incluíram ações de empoderamento. As Ações Afirmativas possibilitaram a criação da política de cotas de participação por sexo em instâncias do poder. Tal estratégia das feministas liberais objetivou garantir a reserva de vagas para as candidaturas de mulheres aos parlamentos, avaliando que dessa forma seria ampliada a representação feminina. As cotas partidárias foram pensadas como recurso político para uma sensibilização em duas direções: motivar as mulheres a se candidatarem; e interferir na lei eleitoral e obrigar os partidos manterem uma cota mínima de mulheres nas suas listas partidárias. Mas ao que consta isso não ocorreu. Os partidos não foram penalizados quando descumpriam nas normas.

Outras ações procuraram desobstaculizar o avanço das mulheres brasileiras para os espaços na política formal. Mas a representação feminina ainda permanece insegura e baixa. A mini-reforma eleitoral a Lei º 12.034/2009 aprovada pelo Congresso Nacional estabeleceu novas regras para as eleições de 2010 e subsequentes, entre as quais a obrigação de os partidos políticos destinarem 5% do Fundo Partidário às mulheres, reserva de ao menos 10% do tempo de propaganda eleitoral nas mídias e alteração do termo “reserva de vagas” de candidaturas para “preenchimento” de no mínimo 30% e no máximo 70% de cada sexo na chapa registrada.

Mas essas medidas ainda não foram suficientes para a reversão do quadro da sub-representação das mulheres neste espaço e o Relatório de Desenvolvimento Humano ao considerar as medidas do Índice de Desigualdade de Gênero aponta o Brasil, que em 2006 ocupava a 67ª posição perdendo quatro posições e agora ocupa a 85ª colocação entre as 134 nações analisadas. Há um agravo na situação ao longo dos últimos anos. Para esse estudo, o indicativo da queda no ranking de igualdade explica-se, entre outros fatores, pela baixa representação política das mulheres brasileiras que ocupam menos de 10% das cadeiras do Legislativo.

A meu ver, além de uma necessária reforma no sistema de lista aberta para a lista fechada com alternância de nomes – homens e mulheres – (conforme o sistema argentino) não vai ser a solução, mas vai ajudar. Entretanto, alguns determinantes ainda forçam a ausência das mulheres desse processo competitivo: o distanciamento dos partidos políticos de uma formação integrada junto às mulheres e não sómente a procura delas para serviço partidário (alguns partidos têm secretaria de mulheres, mas não é a isso a que me reporto); clareza das mulheres de que o empoderamento através da emancipação econômica é um caminho propício para chegar ao empoderamento político; distribuição equitativa do financiamento de campanha entre candidatos/as pelos dirigentes partidários. Para Tereza Sachet(USP): “As mulheres gastam, em média, 40% a menos do que os homens nas eleições. É mais difícil para elas conseguiram financiamento da iniciativa privada. Se não tiver financiamento de pessoa jurídica, sua chance é muito reduzida”.

A esse mesmo resultado chegou o bolsista GEPEM/UFPA Murilo Figueira ao cruzar os recursos partidários e os particulares das candidatas paraenses nas eleições de 2008. As que foram eleitas conseguiram recolher mais no âmbito privado do que receberam dos partidos.


(Texto originalmente publicado em "O Liberal", PA, em 01/04/2011. A imagem foi extraída de mulheresemmarcha.blogspot.com)


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