Os estudos atuais na área de elites políticas e sua formação nos cargos de confiança dentro de um governo que se instala pós-eleições seja federal, estadual ou municipal tem aberto as discussões no meio acadêmico para outras variáveis nem sempre incluídas, mas ainda assim importantes na exposição mais clara sobre o modo de recrutamento do grupo que será parte da administração pública em, ao menos, durante quatro anos de mandato de um dirigente do executivo.
Na verdade, autores brasileiros clássicos do século XX como Oliveira Vianna (Instituições Políticas), José Murilo de Carvalho (Construção da Ordem e o Teatro de Sombras), Raymundo Faoro (Os Donos do Poder), Victor Nunes Leal (Coronelismo, Enxada e Voto) entre outros, contribuíram para avaliar alguns traços característicos da vida institucional brasileira na área político-administrativa, alguns referindo o perfil e a formação intelectual dos atores investidos na burocracia estatal. Na literatura atual, pressupostos extraídos dessa base teórica evidenciam, mesmo com a redemocratização vivenciada no país, a permanência de formas de pensar e de fazer política, com alguma alteração ao longo do tempo, mas persistindo, ainda, certo comportamento político institucional onde a patronagem serve de emblema a essa cultura política que não é cívica nem republicana.
Maria Celina D'Araújo (2009), professora da PUC-RJ, com vários livros publicados entre os quais dois sobre a elite dirigente do governo Lula diz que o “perfil político dos ministros e a distribuição das pastas ministeriais entre partidos e regiões em cada governo tem sido um tema relevante na ciência política no Brasil. Tem servido como indicador para pensar estabilidade política e governabilidade”. Desse enfoque, ela aponta para alguns teóricos (Hipóllito, 1985; Santos, 1986; Abranches, 1988; Meneguello, 1998) que analisam o reflexo dos ministérios pelo tamanho das bancadas no Congresso Nacional, querendo dizer sobre o número de pastas destinadas a cada partido como parte da coalizão de governo.
E nesse aspecto, considero que o processo de recrutamento político vigora na indicação de nomes que estejam afinados com as políticas do governo, acomodando os indicativos de demandas de líderes partidários e da base parlamentar aliada. Neste caso, é possível avaliar, além da necessária governabilidade responsável pelas indicações que definem o objetivo do “núcleo duro” do executivo, o processo de barganha que gerencia a montagem de nomes no estado atual da situação. Há também a coorte de experts que configura um grupo aparentemente apartidário com formação específica e qualificações requeridas em determinado assunto para o desempenho das atribuições do cargo a ocupar.
Com a baixa informação sobre a motivação de certas escolhas, a opinião pública revela-se apreensiva se tal pessoa fará uma boa administração ou não. Muitas vezes manifesta-se uma dificuldade intima do/a eleitor/a em aceitar as indicações, devido a carência de esclarecimentos sobre o indicado.
Em entrevista a uma rede social, diz D'Araújo: “O Brasil se ressente muito de estudos que mostrem o perfil, as qualidades, as características de seus quadros dirigentes. Nós não conhecemos quem manda no dinheiro, quem manda na vida pública, temos muito poucas informações a respeito disso. Não temos um banco de currículos dessas pessoas, não temos informações fáceis. Em uma democracia, é importante que saibamos quem são as pessoas que operam a máquina pública, que autorizam despesas, e assim por diante”(http://www.novoeste.com/).
Pesquisas e estudos sobre a formação da elite dirigente do executivo estadual e municipal no Brasil ainda são raros. O reconhecimento da representatividade do governante eleito para fazer as escolhas e o modo de recrutar a equipe de gestão das secretarias e cargos de Direção e Assessoramento Superior (DAS) por si só não basta. Precisa ser dito se segue regras formais e /ou informais para a composição da maquina política que gerenciará durante quatro anos o estado ou município. Precisa ser um assunto que aponte para a coesão política e a governabilidade e não deixe entrever ardis de compadrio e/ou de “premio de consolação” aos filiados partidários que perderam a eleição e/ou aqueles que mantêm fortes laços no sistema de poder. Precisa deixar a marca do projeto de governo que foi desenhado na campanha para acatar as demandas públicas do eleitorado e não apenas atender as questões pessoais de nomeação de parentela e afins configurando-se o locus da política de compromisso clientelístico. Se o cotejo for o acordo partidário, então o recrutamento dessa elite política deve tributar com base em um padrão meritocrático onde a competência se vincule à ética e a responsabilidade democrática.
(Texto originariamente publicado em "O Liberal-PA, em 07/01/2011)
Oi Luzia,
ResponderExcluirO post é importantíssimo na atual conjuntura. A gente vive ouvindo das pessoas que não há o que esperar da política, que político é tudo igual, que só pensam em si, do que é testemunho o noticiário sobre as pressões por cargos. Você toca em um aspecto importante, que diz respeito a protocolos que possibilitariam um melhor acompanhamento desses recrutamentos de cargos, mesmo que mantendo as linhas políticas e partidárias que orientam necessariamente essas escolhas. Uma boa contribuição nesse sentido seria indicar exemplos de casos de aplicação dessas práticas de controle social indicadas pela autora que você discute.