quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

TRIBUTO DE SAUDADE A SAFFIOTI




Heleieth I.B. Saffioti , a grande pesquisadora, pensadora, professora, feminista faleceu no ultimo dia 13, aos 76 anos, em São Paulo/SP. O mundo intelectual brasileiro perdeu não só uma grande incentivadora dos estudos sobre a questão da mulher, mas e principalmente sobre a violência doméstica, o marxismo, a história das mulheres brasileiras, escrevendo um dos livros mais importantes para estes estudos hoje esgotado: “A Mulher na sociedade de classes- mito e realidade”)1969). Foi importante na formação de toda uma geração e esse testemunho pode ser dados por quantos leram seus livros, artigos ou presenciaram suas conferências, palestras em tantos eventos nacionais e internacionais.
Ao notificar esse infausto entre as colegas do GEPEM/UFPA, recebi inúmeros emails que passo a publicar. (Luzia Álvares)

Disse A Dra. Maria Cristina Maneschy( PPGCS/UFPA):

Heleieth I.B. Saffioti foi uma grande pesquisadora sobre a condição da mulher.
Através do GEPEM (Grupo de Estudos e Pesquisas Eneida de Moraes sobre Mulher e
Relações de Gênero), soube hoje da morte da Professora Heleieth Safiotti, uma
das pesquisadoras que abriu ricos caminhos de investigação
sobre a condição social da mulher no Brasil. Caminhos que se abriram e não mais fecharam ou, melhor dizendo, ampliaram-se e enveredaram por vias muito profícuas, através dos estudos feministas e de gênero.

Não a conheci pessoalmente. Mas, certamente, compartilho com muitos colegas o reconhecimento de que ela foi uma referência na formação dos cientistas sociais brasileiros. Em seu grande livro “A mulher na sociedade de classes, nos anos 1970, sob uma perspectiva marxista, ela levou seus leitores a compreenderem essa "condição", ou seja, essa posição social particular da mulher, seu status diferenciado do status dos homens, na dinâmica social mais ampla. As discriminações que as mulheres sofriam, expressas com especial clareza nas principais características de sua inserção no mercado de trabalho, não eram resultado de uma disfunção, ou de uma visão atrasada, sobretudo em sociedades economicamente menos desenvolvidas. Visão que, portanto, seria superada com a modernização.

Safiotti evidenciava, por exemplo, através das estatísticas sobre trabalho feminino no Brasil, o quanto elas estavam atrás em carteira de trabalho assinada, salários e acesso ao emprego formal.
A notar que, com sua respeitável bagagem acadêmica, ela elaborou um estudo pioneiro sobre o emprego doméstico - que era então, disparado, o principal absorvedor da força de trabalho feminina no país. Eram trabalhadoras que tinham alcançado há apenas poucos anos, em 1972, uma cobertura mais convincente de direitos trabalhistas. A nova legislação deixava para trás aspectos das relações servis que as profissões domésticas haviam recebido do escravismo e que teimavam em permanecer nas relações entre patrões/patroas e empregados, sobretudo empregadas, pois eram mulheres que prevaleciam numericamente nessas profissões.
Pois bem, Heleieth Safiotti analisou com notável profundidade teórica e empírica, várias teias que ligavam as discriminações, não só de gênero, mas também étnicas, e as rodas da economia capitalista. Também no capitalismo moderno, a divisão sexual do trabalho era um elemento estrutural da ordem social. Neste caso, herdando princípios de classificação subalterna historicamente anteriores, as mulheres apresentavam-se como força de trabalho passível de um grau de exploração mais acentuada, em benefício dos empregadores. Na condição social da mulher trabalhadora conjugavam-se sistemas discriminatórios de gênero e de classe, contribuindo a sua maneira para a reprodução do modo de produção cujo móvel é a acumulação.
Ademais, as mulheres, que haviam sido alvo de pouca atenção entre os clássicos das Ciências Sociais, apareciam também desempenhando papéis de grande relevo na sustentação do sistema econômico. De um lado, concebidas e auto concebendo-se como "ajudantes", trabalhadoras secundárias, de menor importância, elas assumiamcom frequência funções que Marx havia analisado como parte do "exército industrial de reserva", do tipo que podiam ser dispensadas e reabsorvidas conforme os ciclos econômicos. E, ainda, com seu labor gratuito na manutenção cotidiana dos trabalhadores da ativa e das próximas gerações, as mulheres no lar também foram percebidas como estruturalmente ligadas com a reprodução da ordem social de classe. Elas contribuíam para rebaixar o valor da mão de obra no mercado. As ideologias de gênero amenizavam a percepção dessas forma de exploração que se davam dentro e fora dos espaços da produção econômica.
Estas linhas sobre seus estudos de fato não fazem justiça à obra da autora e ao impacto que suscitou no meio acadêmico. Faço estas reflexões no sentido de reafirmar a importância de um estudo que pioneiramente no Brasil analisou as vivências das mulheres trabalhadoras e sua importância sociológica. Suas pesquisas contribuíram para uma compreensão mais política dos trabalhos no lar, para a politização da categoria cuidado, que a pesquisa feminista impulsionou e
que o movimento feminista conseguiu muitas vezes traduzir em políticas.

A Dra. Luanna Tomaz (PPPD/UFPA) disse:

(....) expresso meu pesar pela morte desta grande mulher, que conheci quando a mesma veio em Belém, e que tanto contribui para os estudos sobre mulher e feminismo em nosso país.


A Dra. Ana Cleide Moreira (PPGP/UFPA)

Colegas,

Minha homenagem a Heleith Safioti:

Hoje, São Paulo chuvosa, assiste a
partida de uma feminista que mudou nossos rumos de mulheres brasileiras.
Ela
se vai, sabe-se lá para onde, mas aqui deixará saudades.
Sua generosidade em
analisar a si mesma, enquanto pensava em todas, foi talvez sua maior grandeza.

Outras colegas do GEPEM/UFPA estão enviando comentários sobre a nossa grande Heleieth Saffioti falecida no dia 13/12.

Disse a Dra. Maria Angelica Maués (PPGCS/UFPA)

Luzia querida e Colegas

Quero comungar com o sentimento expresso por todas de imenso pesar pelo falecimento de Heleieth Safiotti, pioneira e sempre dedicada ao estudo e participação política, nos embates nacionais e internacionais, voltados para aquilo que se pode chamar de "causa feminina".
Conheci Heleieth (a distância) como participante assídua, acho que até os anos noventa, das reuniões da ANPOCS, e tive a grata oportunidade de assistir a uma linda e merecida homenagem, sob a forma de uma mesa-redonda, onde várias de suas ex-alunas, hoje profissionais reconhecidas na área das ciências sociais falaram da professora e pesquisadora com muito carinho e a exposição pública de seus méritos como incentivadora e mentora de gerações de outras mulheres es tudiosas e dedicadas ao tema&causa que ela, corajosamente, abraçara.
Lembro de vê-la sempre cercada de muitas pessoas, muito ativa e animada nos corredores e áreas de bate-papo, do Grande Hotel Glória de Caxambú, entre as atividades acadêmicas da reunião, nas quais também tinha presença constante e destacada.
Com este pequeno registro da professora Heleieth envio a todas meu abraço.

A Dra. Maria Antonia Nascimento (PPGSS/UFPA) disse:

Heleieth Saffioti foi minha co-orientadora no doutorado e tínhamos uma relação afetiva muito boa. Toda vez que ia
à São Paulo, ligava pra ela e ela fazia questão que fosse em sua casa. Lá batíamos altos papos, pois além de ser vanguarda nos estudos feministas, estava sempre antenada no que acontecia no mundo e na produção do conhecimento. Sempre vi Saffioti como uma grande inspiração!
Forte abraço,

A Dra. Adelma Pimentel (PPGP/UFPA) comentou:

Amigas,

A morte e a vida formam uma dialética.
Não morremos apenas fisicamente.
Há varias formas existenciais de presença e de ausência. A morte em vida pode ser derivada da opressão e da violencia.
Para nosso grupo, a psicologica e a simbolica vorazes que matam a auto-estima, a coragem, a iniciativa, o senso de auto-confiança.
No VIII Encontro Internacional de Genero Saffioti falou para o publico mais de uma hora, e no lema de Nelson Gonçalves foi homenageada enquanto presença viva,
agora que segue etérea, continuará contribuindo para promover rupturas existenciais e fomentar vida que a renovação se instale em nossos atos.
Saudações e carinho ao nosso grupo

3 comentários:

  1. Sem dúvida, uma grande perda para os estudos de gênero e feminismo no Brasil e no mundo. Trabalhei em meu mestrado com o tema das relações de gênero e práticas escolares e seus estudos constribuíram muito para as minhas reflexões. Compartilho com você esse pesar. Abraço, Edna Telles.

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  2. Oi Edna,

    Todas nós, acadêmicas e militantes dos estudos sobre a questão da mulher e gênero temos um tributo com Saffioti. Vamos honra-la continuando nessa linha de estudos e de práticas. A hora é essa.

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  3. Professora, que ótimo encontrar suas reflexões na blogosfera! A perda de Saffioti é de fato inestimável.
    Escrevi algumas linhas sobre tb: http://yzasarmento.blogspot.com/2010/12/obrigada-saffioti.html

    Um abraço!

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