sábado, 8 de março de 2014

AS MULHERES, NO SEU DIA


Mulheres em luta contra a ditadura 


Nas datas especiais há sempre um motivo para centrar as idéias e discorrer sobre elas dando ênfase a este ou aquele ponto mais identificado com quem escreve. As áreas de conhecimento, âmbito acadêmico, revelam-se prolíficas em estabelecer teorias e meios de investigação para este ou aquele enfoque tornando ainda mais especifico o sentido da abordagem. Criam-se especialistas sobre os assuntos e por ai vai a maneira apropriada de tratar as coisas.
Neste sábado, 8 de março, comemora-se o Dia Internacional da Mulher, portanto, um tema que me levou a evidenciar alguns aspectos neste texto. Há mais de 30 anos assumi a questão da mulher como uma especialidade do meu interesse para estudos e pesquisas acadêmicas. Dizer que sou expert nesse tema é ter muita ousadia para essa afirmação. A cada dia paradigmas são quebrados nas ciências humanas e sociais e entre estes se tem a situação da mulher como um eixo que vai subvertendo a onda das descobertas de estudos sobre a metade universal dos seres humanos.
Na visão de alguns, anteriormente, englobar no termo homens era a maneira universal de tratar dos humanos. Naturalizado pelo convencionalismo não era questionado porque entrava ai desde a questão da linguagem e termos que deveriam ser corretamente absorvidos e subsequentemente escritos. Aos poucos esse olhar criou uma maneira de ver a questão biológica afetando a política de tratamento dessa categoria social incluindo então o conceito gênero e suas intercorrências em outras línguas. No Brasil, vai-se nos dicionários e estes definem gênero como “conjunto de seres ou objetos que possuem a mesma origem ou que se acham ligados pela similitude de uma ou mais particularidades”. Derivados dele como “generificar” não existem nesses compêndios, mas no inglês sim, ou seja, gendered – que numa perspectiva inovadora, é um termo que define uma ação marcada pelo gênero. Da biologia à cultura um passo agigantado marcou as mudanças mundiais sobre o tratamento concedido aos humanos vistos com o sentido da divisão sexual no âmbito da ciência biológica, marcador anatômico da condição entre os sexos. Mas a cultura deu outra dimensão a essa categoria do ser homem e do ser mulher. E assim, as maneiras de identificá-los foram desmontando o tratamento único embora diverso e incorporando os vários modos de ser da cada uma dessas categorias. Entretanto, a convenção marcando a representação social tornou seriamente irredutível tanto o tratamento formal da lingua quanto de atitudes reconhecidas como coladas à situação de homens e mulheres e inconcebíveis de serem assumidas por um dos dois sexos não fosse aquela definida para cada um deles, sob pena de serem vistos como subvertendo a ordem humana do gênero de nascença. Da indumentária ao gestual a diferença se dava pela dimensão do sexo. E assim foi sendo convertido o espectro humano exigido pela sociedade e, subsequentemente, aqueles/as que fugiam à imagem configurada pela tradição sofriam penalizações e se tornavam desviantes da cultura de seu sexo.
Tentando avaliar desde o momento em que pessoalmente me identifiquei como mulher, evidencio a corrente tradicional sempre ganhando valor ao definir usos, hábitos, ações e comportamentos próprios ao sexo feminino. As garotas que fugiam ao padrão, na minha cidade, eram sempre discriminadas devido a não se portarem como “meninas”. Atividades do tipo jogar futebol deveriam ser declinadas por esse gênero por seu pertencimento aos valores masculinos. Brincar de boneca, saber cozinhar, lavar & as demais atividades “do lar” tendiam a ser da minha alçada, enquanto ajudar meu pai no comércio, carregar mantimentos para casa, eram da alçada dos meus irmãos. Minhas roupas diferiam das deles, porque meus vestidos embora da mesma cor tinham rendas e bordados, enquanto os chamados fatos que eles vestiam eram isentos desses enfeites. Na escola, as meninas sentavam junto com as colegas e eles com os garotos. E assim, se tornavam hábitos cunhados como fortes valores que eram exigidos de nós desde criança, sendo, por isso mesmo, considerados, naturalmente, uma atitude ipso fato (me desculpem os juristas o uso deste termo latino aqui), ou seja, efeito consequente direto de uma ação em causa. E na torrente de acúmulos de hábitos e costumes sociais determinando os nossos comportamentos, a questão do namoro, do noivado, do casamento seguia uma linha clássica fortalecendo a categoria do “homem provedor” e da “mulher do lar” em que as predestinadas a este espaço eram as “santas” enquanto “as outras” eram vistas como “p....”, ou seja, “mulheres da vida”.
Forjam-se corações e mentes nesse clássico modelo e assim se tornam determinantes para as exigências. As que não seguem esse padrão são penalizadas e “malvistas” por todas as cabeças, mesmo as pensantes, ou seja, os donos do saber, os doutos que escorregam para os seus livros as facetas tradicionais como destidos determinantes das mulheres. Além do mais, porque a religião é uma instituição que forja suas regras para essas predestinações, a carga de des-valores para as mulheres se torna ainda mais exigente.
Hoje, ao avaliar as mudanças do novo momento em que a questão da mulher e as relações de gênero passaram a ser ponto de estudos e avaliações de todos os seculares costumes que as submetia às grandes violências porque não seguiam o padrão instituido, vejo que muitas conquistas nos fazem ir para as ruas e mostrar ainda mais pesares sobre aquelas que ainda morrem pelas armas de homens hostis que exigem delas um tipo feminino forjado pela patriarcalismo. Estou nessa marcha assumindo a postura de uma militante que acredita que os direitos das mulheres são também direitos humanos. (imagem de http://www.docentesfsd.com.br/ )

(Texto originalmente publicado em "O Liberal", de 07/03/2014)





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