sexta-feira, 19 de outubro de 2012

COMEMORAR O DIA DO PROFESSOR


 
         Na segunda feira, 15, comemorou-se o dia do professor. Lembro que em outros tempos havia festinhas nas escolas para marcar a data, ou uma comemoração especial aos mestres. E os/as professores/as, o que fizeram ou pensaram nesse dia para registrar o evento?

Com as redes sociais bombando, ao visitar uma dessas mídias, observei depoimentos interessantissimos sobre essa profissão, alguns revelando-se ardorosamente convictos de que haviam abraçado esse mister como vocação interessados pela formação educacional e pela aquisição do saber múltiplo onde a profusão de conhecimentos tende a levar a novas trajetórias. Maneiras de ser professor/a também se cruzaram nos post durante o dia inteiro, uns curtindo e/ ou compartilhando pensamentos sempre dignificadores dos educadores. Agradecimentos aos professores com os quais haviam aprendido a “escrever, a ler, a andar, a abrir as janelas e as portas da vida, e, principalmente, a pensar e despertar para o universo das escolhas” também foramaram notas, conforme o dito de Dolores Coelho, em seu post no facebook.

Alguns/as lembraram o filme “Ao Mestre, Com Carinho”(1967) e, de alguma forma, identificaram, nas seqüências desse filme, lances de seu próprio cotidiano. As circunstâncias apresentadas – que mostram um professor negro comandando a revolução comportamental de jovens de etnias diversas, de baixo poder aquisitivo do East End, bairro operário londrino, estimulando-lhes o gosto pelo saber e o respeito por si próprios – catalogaram o filme no gênero comédia, mas é drama mesmo. Os menos céticos, consideraram a possibilidade de transformar, nas mãos do mestre, com o látego da tolerância e do reconhecimento das condições específicas, as cadeias indecifradas da resistência que opera contra os bons princípios.

Do mestre que se parabeniza pelo feito em sala de aula, ao professor que conseguiu chegar ao topo de suas práticas e, por isso, é homenageado oficialmente, como demonstra o personagem de Ingmar Bergman em “Morangos Silvestres”(1957), os tipos povoam as escolas e o mundo e levam para a multidão um pouco do seu saber. Mas a profissão já teve seus dias de glória e hoje cai em baixa. Do respeito aos direitos e da exigência dos direitos em todos os sentidos sente-se que há um esfacelamento social na postura do poder público em negar a esses profissionais a dignidade de serem bem tratados, bem pagos e trabalharem em boas condições.

Interessante observar que na perspectiva de gênero dessa profissão, discriminações são sofridas de diversas formas. Um exemplo. No dicionário do Aurélio tem-se a seguinte referência aos verbetes : [Do lat. professore.] S. m.  1. Aquele que professa ou ensina uma ciência, uma arte, uma técnica, uma disciplina; mestre; 2. Fig. Homem perito ou adestrado. 3. Aquele que professa publicamente as verdades religiosas. Professor titular. 1. O que exerce cátedra (3); catedrático. A flexão para o feminino (professora) o dicionário considera: 1.Mulher que ensina ou exerce o professorado; mestra. 2.     Bras. N.E. Pop. Prostituta com que adolescentes se iniciam na vida sexual.

         No tom da informação nota-se a diferença do enfoque. Do que professa “uma ciência, uma arte, uma técnica”; etc., ou do que exerce cátedra, no masculino, desloca-se o verbete para demonstrar que a mulher que é professora simplesmente “exerce o professorado” ou que é “prostituta” a que “serve” (o verbo usado por mim tem a expressão que se nota na frase, referente à submissão da prostituta ao cliente) os adolescentes que se iniciam na vida sexual”. O sentido popular brasileiro não tem nenhum tom irônico para o “professor”. Ser catedrático é a compensação maior para aquele que ensina artes & técnicas. E neste (ensino de artes & técnicas) a sexualidade é vista como “arte” menor, prostituída. E quem a exerce é a mulher.

         Tomei como exemplo o “Aurélio” somente para manter o fio condutor de uma reflexão sobre a categoria de professor. Neste tom reflexivo coloco uma outra pergunta: por que a comemoração pálida da mídia no dia do professor? Veja-se a diferença quando a efeméride registra “dia da mãe”, “do pai”, “da criança” e tem-se clareza da inexpressiva dimensão que hoje assume a categoria em nível social e político. No primeiro caso, o reflexo da baixa expressão acha-se nesse exemplo da mídia, mas também na ausência de referência das escolas aos seus mestres. No segundo caso, o professor que é funcionário público e cujos salários são baixos, mas pagando altos impostos a cada dia mais excorchantes, tende a sair de uma greve sem que suas demandas sensibilizem os altos escalões.

Por tudo isso, pela comemoração que não veio, pela homenagem que não considerou o alto nível de trabalho que cada professor/a realiza no cotidiano, assumindo uma rotina massacrante e, muitas vezes humilhante (há quem não tenha dinheiro de ônibus para ir à escola), temos que mostrar que não estamos em baixa estima. Nós (incluo-me entre as/os colegas, em nome de 34 anos de magistério universitário) sabemos que pagamos um alto preço na aquisição do saber, sabemos que temos valor, sabemos que a sala de aula nem sempre é um espaço em evidência, como sabemos que as noites e os dias de trabalho extrapolam domingos e feriados; nos reconhecemos como transformadores do mundo. Nossas palavras são fortes para criar a inflexão da mudança. Nós nos reconhecemos. E isso é o que importa. Parabéns para todos/as nós !

 (Texto publicado em 19/10/2012 em "O Liberal"/PA)
 
(Imagem extraida de : escolaedineagarcia.blogspot.com)

 


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