sábado, 26 de maio de 2012

TEMPO & CASAMENTO


Maio conjuga-se a junho relacionando romances e casamento.
Conhecido no Brasil como “o mês das flores”, maio tendia a ser recordista de nupcias e durante muito tempo justificou o número expressivo de nascimentos no menor mês do ano, fevereiro. Coincidentemente, nesse mes comemora-se o dia de São Velentim, um bispo romano que lutou contra as ordens do imperador Claudio II que priobiu casamentos durante as guerras supondo que os soldados solteiros eram mais eficientes. Valentim casou-se secretamente e por isso foi preso. Na prisão conheceu uma jovem cega, filha de um carcereiro, por quem se apaixonou e restituiu-lhe milagrosamente a visão. Antes de ser executado, ele escreveu à jovem amada assinando: “Seu Namorado”.

Canonizado pela Igreja Católica, o bispo deu margem a que na maioria dos países ocidentais o Dia dos Namorados fosse o 14 de fevereiro, data de sua morte. Houve analogia com festas na Roma antiga em honra a Juno, deusa da mulher e do matrimonio. No Brasil, a transferência para 12 de junho ocorreu em função de ser véspera do dia de Sto Antonio, tido como “santo casamenteiro”.
Semana passada os jornais publicaram o alto indice de divorcios contra o numero bastante inferior de casamentos no nosso Estado. A expressividade do fato requer uma análise do nucleo familiar nos novos tempos.

O divórcio no Brasil foi oficializado na emenda constituicional nº 9 de 28/06/1977, regulamentada pela Lei 6515 de 26/12 do mesmo ano.O termo vem do latim “divortium”que quer dizer separação. É uma das formas de dissolver o matrimonio (no caso, o civil, visto que o religioso, especialmente o católico, não considera isso), com a outra sendo a morte de um dos cônjugues.

Antes do divórcio, os casados que não mais afinassem seus sentimentos & razões recorriam ao “desquite” que era uma separação sem quebra do vínculo matrimonial. Apelando para este recurso, os casados se separavam, mas não podiam casar de novo, obviamente com outros parceiros. Mesmo assim, não se via o desquite com tanta frequência nos primeiros anos do século passado. O que acontecia era que os casados “se aturavam” quando o amor morria (se é que realmente chegava a existir). Havia ainda uma forma de separação bizarra que definia o puritanismo de um tempo: se a mulher não fosse virgem, o marido podia pedir a anulação do casamento logo em seguida à noite nupcial. E neste caso ele podia casar com outra. E ela, ficava mal vista socialmente.

A inspiração em S. Valentim não chega a ser um modelo do casamento ideal posto que o próprio bispo, quando casado e preso, chegou a ter outro amor. Mas nos planos culturais do passado a mulher, principalmente, era educada para seguir os contos de fadas onde o parágrafo final, sobre um plano de casamento da heroina com seu principe dizia “...e foram felizes para sempre”. Interessante observar que a subserviência da mulher implicava em casos dramaticos como o do casamento por encomenda, ou seja, da união patrocinada pela ordem paterna (ou materna) com vistas, quase sempre, a “um futuro melhor” para quem, no entender dos genitores, representava a segurança da filha quando eles morressem. Ou, principalmente, o modo de assegurar bens até para eles próprios, aquinhoados da fortuna do genro. Na área politica aconteciam os “casamentos de estado”, ou seja, a união de familias nobres como forma de associar coroas. Na historia brasileira os nossos dois imperadores casaram-se com damas de outras cortes a seguir o fortalecimento da coroa.
Quem viveu, como eu, os anos 1950/60, quando o casamento era precedido do namoro e do noivado, a observação das mudanças processadas desde o final dessa ultima decada, onde surgiu a chamada contra-cultura com a liberdade sexual, é flagrante. Hoje a virginidade deixou de ser um parâmetro para que se processasse “sem receios” uma união entre homem e mulher especialmente das classes média e alta. Não se diz mais “namorou”, mas “ficou”. Há diversidade na orientação sexual, conjugam-se novos verbos e a melhor definição de comportamento está nas comédias romanticas surgidas na literatura ou no cinema quando o beijo é precedido por uma cena de alcova.

Os metodos anticoncepcionais tambem ajudaram na nova forma de união. A jovem “se previne” no encontro intimo com seu namorado. Por isso, as estatisticas tambem informam a queda de nascimentos na região. E não se diga que isso é previlégio da tecnologia farmacêutica: antes havia chance de controle da natalidade (a camisinha, por exemplo, vem da Grecia antiga quando era usada bexiga de peixe como matéria do invólucro preservativo). O casal tinha filhos (e muitos) porque conscientizava que havia casado para procriar, levando em conta postulados religiosos. E muitas mulheres se sujeitavam à gravidez de risco com receio de contrariar suas crenças e “aborrecer” familiares e marido.

Hoje a mulher, assim como o homem, opta por seu estado civil sem pensar que um dia muitas de suas ancestrais já viveram uma “alcova obrigatória”, imposta por conveniências. Mas o amor romântico sempre foi de todos os tempos. Contudo, a pergunta que se faz, na liberação de tabus, é onde ficou o romântico da vida em comum. Quantos casais no correr dos anos continuam amantes? Anos atrás Roberto Martins e Mario Rossi compuseram a valsa “Bodas de Prata”, gravada por Carlos Galhardo, que entendia 25 anos de casamento como uma gloria do amor longevo. Vivia-se menos é verdade. Mas o certo é que o amor não tem idade nem se alimenta de preconceitos.

(Publicado originalmente em "O Liberal", de 25/05/2012)

[1] Luzia Álvares é doutora em Ciência Política.

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