Imagem de Belém sob chuva . Foto Katia Oliveira.
Inicio de ano marca o nosso “inverno amazônico” e o
verão de outras regiões brasileiras. A estação, ou as estações,
caracteriza(m)-se por períodos chuvosos prolongados e volumosos. Nas
proximidades de rios/mares as precipitações atmosféricas juntam-se às altas das
águas circundantes e o comum é ver na mídia escrita e televisionada as
tragédias da população que vive próxima ao aumento de volume das águas.
A grande pergunta que se faz assistindo a reprise de
acontecimentos ligados a desastres naturais é: por que não se tomam
providencias para que essas situações não se repitam ano após ano.
Mas a situação das cheias e das intempéries naturais em
cada fase do ano não é tão simples de ser avaliada. Pessoas que residem por
extrema necessidade em barracos vulneráveis às intempéries respondem
simplesmente às indagações de quem acha que a profilaxia dos desabrigos é a
mera mudança de endereço: “não tem para onde ir”.
O retrato cruel das cheias e das destruições urbanas
devido à invernada ficam expostos no exército de desabrigados lotando espaços
públicos como ginásios e abrigos improvisados. E, nesses casos, entram em cena
as missões de ajuda do governo, da população convocada pela mídia ou pelos
abnegados grupos de auxilio comunitário, seja com alimentos, seja com remédios,
seja com roupas. Tudo isso sai por um custo, tanto dos recursos do governo como
das ciladas da própria natureza. E como evitar esses custos?
Qualquer solução apontada por políticos e francos
“entendidos”no assunto é geralmente utópica se não baseada em estudos. A atual
campanha de casas populares (o programa “Minha Casa, Minha Vida”) me parece uma
ajuda interessante. Construir habitações populares em espaços isentos de
perigos naturais é uma forma de minorar o antigo e sempre renovado problema. Há
os críticos a esse programa, mas minha indagação é: já se perguntou aos que
hoje estão contemplados o que eles acham de estarem de fora das prováveis
intempéries anuais? Independente de favorecimento ideológico em torno de qualquer
plano de governo considero que os que tendem a garantir certas melhorias de
vida às populações devem ser reconhecidos.
Há uma literatura que menciona algumas obras que podem
ser planejadas e construídas para controle das inundações no meio urbano: construção
de diques, barragens e bueiros, estes últimos em casos de menor efeito. A
teoria cita exemplos da Holanda e Alemanha, especialmente no primeiro país onde
a superfície abaixo do nível do mar estimula o quadro. Mas há peculiaridades
regionais, em termos de Brasil, onde essas estruturas não podem ser
perfeitamente introduzidas. Nos lugares com morros, o deslizamento é constante
nas épocas chuvosas e nas planícies, como o nosso caso, o avanço das marés é
uma contingencia histórico-geográfica. As cheias sempre atingiram moradores das
proximidades dos rios. Neste caso, o deslocamento de habitantes luta contra o
trabalho profissional, especialmente de quem vive da pesca.
Qualificar profissionais quanto ao mapeamento dos
riscos, procurar avaliar tanto em nível qualitativo como quantitativo esses
riscos, e mapear as políticas já propostas para conter as inundações deveria ser
uma preocupação de grande envergadura dos governantes para criar e desenvolver
estratégias e ações planejadas visando o enfrentamento dos riscos.
A tese de doutorado do pesquisador Paulo Roberto
Ferreira Carneiro do Laboratório de Hidrologia e Estudos do Meio Ambiente da
COPPE/UFRJ, de título: “Controle de Inundações em Bacias Metropolitanas,
Considerando a Integração do Planejamento do Uso do Solo à Gestão dos Recursos Hídricos.
Estudo de Caso: Bacia dos rios Iguaçu/Sarapuí na Região Metropolitana do Rio de
Janeiro” [Rio de Janeiro, 2008,] trata da “integração do planejamento do uso do
solo à gestão dos recursos hídricos, com enfoque no controle de inundações”. Para
o pesquisador, essa gestão “em regiões metropolitanas vincula-se, em grande
medida, às características da ocupação e do uso do solo das bacias
hidrográficas inseridas nesses territórios”. Aprofundando o estudo do tema ele visou “elucidar
os desafios e as perspectivas para o seu
gerenciamento em bacias densamente urbanizadas. Os novos arranjos
institucionais em fase de implantação no país assumem papel de destaque, na
medida em que poderão ocupar o “vazio” institucional deixado pelo abandono da
“gestão metropolitana”. Paulo Roberto Carneiro então levanta a seguinte
questão: “Que novos paradigmas de planejamento e gestão poderão emergir da
articulação dos novos instrumentos de ordenamento do solo com as diretrizes da
política nacional de recursos hídricos e da política de saneamento básico,
recentemente aprovada?”
São essas questões que levam ao debate o assunto que
estamos evidenciando aqui. A tese do professor não leva só a isso, mas propõe “alternativas
que conduzam à gestão integrada em bacias metropolitanas”. Instigante na
proposição, ele vai “na ferida” da situação
mostrando entre os capítulos dois interessantíssimos “A experiência
internacional no controle de inundações urbanas – tendências recentes da União
Européia” e “A experiência recente no Brasil na regulação pública: dos recursos
hídricos e saneamento”. Um trabalho de fôlego que aponta resultados se houver
comprometimento político na situação histórica das inundações.
De qualquer forma, “fugir das águas” é matéria política
de grande alcance. Serve de plataforma a muitos candidatos/as a cargos eletivos
mesmo se sabendo que eles não possuem condições de resolver o caso. Para quem
foi eleito e recebe os reclamos dos eleitores, a situação aposta em duas
vertentes: ou jogar o problema para autoridades superiores ou se atrelar a
medidas paliativas, aliando-se aos movimentos de assistencialismo assumidos por
diversas fontes civis ou religiosas. Mas isso não é o certo. Pelo menos para
quem ouve a fala desesperada dos atingidos por esses problemas.
(Texto originalmente publicado em "O Liberal"/PA, de 18/01/2013).)
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