Foto de março de 1961 - Um barco, os caminhos, as travessias ...
Nada,
nada, são 80 anos. Como é chegar a essa idade? Vivendo, ora. Mas a sentença
etária define-se pelas fases da vida e a contagem já apresenta um repertório de
caracterizações que as áreas de conhecimento, de um modo geral, criam
adequações utilizando-se desses formatos para extrair as representações de cada
uma.
Do
nascimento à velhice as peças de um quebra-cabeça existencial revelam a
estrutura da ambiência vivenciada por uma pessoa considerando-se hoje os
marcadores sociais da diferença com evidência nas situações de gênero, geração,
classe social, raça, orientação sexual. Que em tempos pretéritos
condicionava-se nos aportes da cultura de uma natureza humana em que o mundo
material definia a condição originária sem mostras de que as fases de vida dos
humanos sofria os impactos desses marcadores.
Hoje
(09/08) o Pedro Veriano completa 80 anos. Na verdade, a reflexão que faço quer
repercutir no que essa idade exprimia para a nossa geração e para o momento
atual. Daí a referência aos marcadores sociais. Sem estes não é possível contar
hoje a história de alguém. É a História no tempo presente.
Nascido
de pais já maduros, conviveu com as brincadeiras infantis de um garoto de
classe social média, estudou em casa com professor particular, só criando maior
socialização na pré-adolescência quando foi matriculado em colégio particular.
Nesse tempo encontrou amigos e conviveu com as brincadeiras próprias ao seu
gênero, mas já se iniciara em gostar de cinema, de literatura, de desenho
gráfico, de música, de leitura, de ficção científica, de criar enredos para
novelas de rádio, de escrever jornalzinho e roteiros para filmes e tirar
fotografias.
É
esse o adolescente, depois o jovem e, mais tarde, o adulto que definiu sua vida
profissional em outros moldes, nos que a família esperava fazê-lo seguir num
estudo superior. E a medicina foi o ramo escolhido, considerando que o irmão
mais velho já se fizera médico.
O
Pedro que eu conheci, já estava na juventude. Na mesma geração que a minha, e embora
ele residisse na zona urbana do estado, representava, ao meu ver, aquele jovem
que estava “pronto” pra namorar. E dessa fase em diante conjuga-se outro
marcador, a heteroafetividade que àquela altura era vista como a situação
natural entre os jovens.
E
lá se vão muitos anos. No processo de convivência, se ontem a cultura condicionava
um modelo feminino à maternidade, à educação dos filhos, ao espaço privado do
lar para desenvolver as qualidades naturalizadas ditas “femininas”, e aos
meninos a condição era de se tornar o provedor do lar, conquistando o espaço
público e o trabalho, aos poucos foram se sucedendo mudanças nesse processo e o
aspecto imposto culturalmente e autoritário pela aliança de casamento foi se
desfazendo em parceria. A ideia de sujeitar-se a esses modelos masculino e
feminino estava internalizada, sendo necessário uma grande onda de novas
práticas para contrapor-se aos costumes esperados.
Vimos
o tempo passar. Vimos as mudanças sociais se desenvolvendo na trilha do grande
projeto de vida sendo construído, que indicava novas personagens entrando em
cena (filhas, genros, netos/as, bisneto) daí tratar de começos e re-começos. E
se pensávamos em começos, nessas novas historinhas já criávamos processos de
re-começo. E a vida continuou e vai continuar.
Ontem
perguntei ao Pedro Veriano: como é chegar a essa idade? Ele me disse:
“Fred
Astaire morreu aos 88 e foram comunicar ao Irving Berlin, o compositor, que
chegou aos 101. Irving estava na casa dos noventa e passeando com seus
cachorros pela rua exclamou: “Mas o Astaire? Tão jovem!”. Assim eu me sinto
chegando aos 80. A cabeça vai bem e isto me parece o mais importante. E quando
todo mundo fala em idade eu penso ainda em Henry Rider Haggard (1886-1925) no
seu livro “Ela” (She, 1887) filmado duas vezes com o nome brasileiro “Ela, A
Feiticeira”. Ele escreve que o maior inimigo do homem é o relógio, que
gradativamente vai registrando seu envelhecimento e, obviamente, o caminho da
morte. Medir o tempo dá nisso. Melhor é festejar o que já se venceu. E melhor
ainda é aquilatar a qualidade do que passou, o que foi bom, útil, criativo”.
Lindo! Dizem que o tempo é remédio para todos os males! Também acho que sim, porque o tempo nos faz amadurecer e nos torna sábios...E a sabedoria leva o tempo do relógio para o tempo da essência, onde a morte é apenas um termo para transcendência da alma. Pedro Veriano já se eternizou em sua obra. Amei o texto.
ResponderExcluirBeijo, filha, nossas escritas, muitas delas, repercutem deste os históricos, as lembranças e, acima de tudo, os afetos. Amo escrever sobre vocês. Te amo.
ResponderExcluir