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Nas manifestações de rua acontecidas no
domingo (15/03) houve quem portasse uma faixa pedindo intervenção militar no
governo e/ou que este grupo voltasse ao poder (?). Lembrei-me de dois fatos que
se assemelham: um que se chamou “marcha da família com Deus e pela liberdade” com
a mídia instigada por Assis Chateaubriand dos Diários Associados & empresas
(cf. http://www.jornalmovimento.com.br)
que pedia a exclusão do governo de João Goulart como um meio de livrar o Brasil
do “comunismo ateu”. Outra, já instalado o regime de força (13/06/1964), pedia
“ouro para o bem do Brasil” levando bandeiras estendidas para colocar dinheiro
ou joias que seriam contabilizados para pagar as dívidas nacionais. A primeira
trocou ameaça de uma nova Cuba por um período em que a liberdade civil foi
virtualmente cerceada. A segunda não mereceu ao menos uma contabilidade levada
a público. Circulava de boca em boca (pois a censura não admitia anedotas) que
o ouro era um bem muito particular. Não se falou em “lava jato”.
Em 2013, as manifestações de junho com amplitude
plenamente democrática partiram de uma campanha contestatória aos aumentos nas
tarifas de transporte público com uma visão de protesto pacífico, levando,
entretanto, a uma segunda fase com focos de vandalismo e represálias.
Manifestações populares são impensadas
num regime ditatorial. Mesmo em governos que mascaram ditadura com uma fachada
democrática, o ato de protestar gera prisão com todos os elementos que possam
acompanhar esse ato. Afinal, democracia vem do grego dēmokratía que significa "governo do povo". Na teoria
clássica diz-se que é o cidadão que governa através de pessoas que elege para
governar. Se essas pessoas não demonstram nos postos a que são eleitas, dignas
da confiança de quem as colocou ali, elas são cobradas dos que as elegeram. Mas
os protestos nem sempre se dirigem a governantes. Cabem, muitas vezes, a atos
de governo, ou a fatos que de alguma forma se ligam a parâmetros
governamentais. Há dois anos o motivo dos protestos começou no aumento das
passagens de ônibus urbanos. Hoje cabem na Petrobras e, por continuidade, nas
revelações de falcatruas que existiam na empresa nacional. Evidentemente, os
motivos, em ambos os casos, extrapolam para outros que flagrantemente revelam
propostas de oposição politica. E são tratados parcialmente nas informações. Como
houve uma eleição recente em que foi reeleita a presidente da nação, além da
base parlamentar, os opositores seguem a velha cantiga de que “o povo elegeu,
mas já se arrependeu”. Uma análise extremamente rápida de uma situação que tende
a refletir a vontade do que já se chamou de “terceiro turno”.
O que é importante
observar nas manifestações populares de rua é que elas tendem a ser manipuladas
e escancaram opiniões até mesmo sem conhecer a história dos protestos no país.
Muitos “passeiam” pelas avenidas ao som do que possa ritmar uma dança. Afinal é
uma novidade, um novo programa dominical. Naturalmente há quem esteja
desfilando ciente de elementos críticos, julgando os atos dos mandatários pelo
que observa através da mídia. E ainda hoje esta ganha espaço no que é impresso,
no que é televisionado, no que passa pelas redes sociais. Essas notícias
veiculadas de diversas maneiras em várias versões tendem a regular o raciocínio
de muitos que não conhecem meandros de um sistema de governo, que sentem o
aumento do custo de vida como um desacerto de mandatários irresponsáveis ou que
não sabem administrar. Com a idéia de que está custando mais caro o que ontem
era mais barato, por culpa exclusiva de governantes, começam os protestos. E estes
aumentam quando a própria mídia revela a corrupção nas diversas áreas que geram
o custo de vida (a energia elétrica, por exemplo).
O ato de protestar é
como já disse um cientista, “ atitude fisiológica”. Protestam os contrariados,
mas também protestam quem acha que as coisas podiam estar melhores. No caso, o
ato de protestar ganha volume quando engrandece, em termos. Uma pessoa
escrevendo no facebook ou no twitter que é contra um determinado assunto não
ganha espaço como unida a outras pessoas e ganhando as ruas para dizer o mesmo.
Até porque essa forma adquire mais espaço em outras mídias.
O que ressalta o
valor democrático é a demonstração de desacordo sem beligerância. Na onda de
protestar contra o aumento dos ônibus queimaram-se carros, bancos, lojas,
atacaram transeuntes, demonstraram uma guerra contra seu próprio bem posto que
o quebra-quebra atuava em espaços públicos. Mas cabe a fonte dos protestos
analisar bem as manifestações e respondê-las com a consciência de que se
existem erros o melhor é corrigi-los. Nunca se quebra um pote porque a agua
está suja. O trabalho é limpar e, no país onde a corrupção existe desde os seus
primórdios, é importante ver que hoje há tentativa de eliminar esta corrupção,
detendo os corruptos, pugnando pelo cumprimento das leis, fazendo com que o
povo sinta que é governo, que os seus eleitos merecem confiança (em caso contrário
que sintam isso e mudem de alguma forma).
O ato de protestar,
repito, é saudável num sistema democrático sem desvios. Quem poderia protestar
contra a Constituição escrita pelo primeiro imperador (D. Pedro I)? Quem
protestaria contra as torturas que se faziam no governo militar, incluindo a
terrível “Operação Condor” que jogava no oceano os corpos ainda vivos dos que protestavam
(e há os que pleiteiam a volta desse sistema)? E é só olhar em torno e ver, por
exemplo, o prefeito de Caracas sendo preso por protestar contra o presidente do
país.
Que viva a nossa
capacidade de dizer o que pensa. Que seja reconhecido, contudo, como dizem os
percentuais nas pesquisas de opinião, que mais de 80% dos que estavam em
protestos neste domingo haviam votado no candidato perdedor nas eleições de
2014, portanto, um protesto partidário.
A pugna de uma parte
da população que não foi às ruas no domingo é para que cheguem ao público
informações isentas de parcialidade, o que realmente não tem acontecido.
(Texto originalmente publicado em "O Liberal" em 20/03/2015)
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