O assunto desta semana em Belém é a realização da IV Conferência Estadual de Políticas para as Mulheres (25 a 27/10). Os debates e preparação para a realização desse evento estadual ocorreram na maioria dos municípios paraenses onde havia a presença de movimentos de mulheres. À frente da mobilização está o Conselho Estadual dos Direitos da Mulher, o Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense, a Coordenadoria de Promoção dos Direitos da Mulher(SEJUDH) que organizaram seminários e miniconferências aglutinando as associadas e membros da sociedade civil e da classe política dos municípios, para discutir assuntos atuais da pauta desses movimentos, além de apresentar novas propostas de políticas públicas que estão sendo percebidas como necessárias às mulheres da zona rural e urbana.
No momento em que comunicadores e formadores de opinião assentados nas mídias nacionais estão a achar “natural” usar certos enredos discriminadores em seu anedotário para estimular o humor do público que os assiste, sendo o exemplo mais recente Rafinha Bastos; e/ou achar que é preciso a mulher “apanhar mais” para dar a volta por cima, como dito pela personagem feminina de recente novela, deixando de reconhecer a importância do serviço de atendimento às mulheres acessando o 180 e/ou não avaliando a responsabilidade pessoal em publicizar esses novos meios de combate à violência doméstica. Enquanto isso tudo está ocorrendo, milhares de mulheres brasileiras se preparam em seus estados anotando e expondo suas necessidades básicas, principalmente denunciando a violência doméstica, a falta de tempo para cursarem escolas (porque não há creches públicas), a falta de oportunidade para entrarem na política formal (representação política e partidária) porque precisam de formação política (a qual os partidos não se comprometem) para competirem às cadeiras nas câmaras municipais, estaduais e federais onde os homens fazem política há muitos anos. Um rol de demandas sobre vários eixos de questões propostos para a melhoria de vida das mulheres e, por seqüência, de seus familiares e da própria comunidade onde vivem será reunido em um relatório elaborado pela comissão da IV Conferência, para que as delegadas paraenses apresentem em dezembro, na 3ª Conferência Nacional, em Brasília.
O que isso representa? É uma nova perspectiva de demonstrar que a sociedade formada pela maioria feminina e mais os simpatizantes masculinos da causa dos direitos humanos não se sentem à vontade, ou seja, se constrangem em ouvir, por exemplo, frases do tipo: "Se está com desejo sexual, estupra, mas não mata", dita pelo então deputado federal Paulo Maluf durante a campanha para prefeito de São Paulo, em 1992. Ou o próprio Rafinha ao dizer, em um auditório com cerca de 300 pessoas, na região central de SP:"Toda mulher que eu vejo na rua reclamando que foi estuprada é feia pra c.... Tá reclamando do quê? Deveria dar graças a Deus. Isso pra você não foi um crime, e sim uma oportunidade. Homem que fez isso [estupro] não merece cadeia, merece um abraço." As gargalhadas soam e reforçam a sintonia com uma cultura anti-direitos humanos. Mas esse repertório discriminador, nessa noite, foi mais além, pois a opinião sobre o estupro seqüenciava o que esse comunicador tratara anteriormente sobre como cumprimentar pessoas que não tem os braços. Assim, mulheres vítimas de violência e deficientes físicos zoavam como marca da sua estratégia de fazer rir. E as pessoas riram e ainda hoje consideram muito “natural” fazer piadas nesse tom. Ouvi de um jovem de 18 anos, recentemente: “se ele [Rafinha] for politicamente correto a piada não tem graça”. É isso o que dá a ausência de limite e bom senso no humor que hoje e sempre tem sido feito com essa justificativa. E o triste é, justamente, que nossos jovens não vêem “nada demais” em brincar com esses estereótipos embutidos como preconceito e jamais crêem em discriminação introjetada de quem se diz comediante.
Mobilizadas para discutir vários tópicos entre os quais a reforma política, a participação e o empoderamento partindo do tema “Mulheres e Pobreza na Amazônia - Desafios da Superação das Desigualdades Sociais e de Gênero”, as associadas dos movimentos identificaram um sem número de prioridades de que necessitam, algumas já inscritas no 2º Plano de Políticas para as Mulheres (nacional) e no 1º estadual, mas outras ações elas avaliaram que na sua especificidade regional e de categoria social precisam estar nesses planos.
Em 2007, num evento sobre reforma política na Câmara de Deputados, reunindo parlamentares, mulheres e homens da sociedade civil, acadêmicas e movimentos sociais e étnicos, entre as várias intervenções recortei da publicação algumas passagens ditas pela então Deputada Luiza Erundina: “A exigência da igualdade de gênero é uma exigência da democracia (...) que é do processo civilizatório. Ou avançamos no processo civilizatório ou não estaria sendo atendida essa condição de igualdade do gênero humano, que somos nós, homens e mulheres. (...) ...mulher nos espaços de poder. Qual é a diferença? (...) Se for para reeditar o modelo masculino no exercício do poder, eles fazem melhor que nós porque estão no Brasil há mais de 500 anos exercitando o poder. (...)Temos que nos reeducar para perceber o nosso papel como sujeitos políticos de uma forma nova, diferente (...) romper padrões culturais, comportamentos tradicionais, o conservadorismo das instituições da sociedade (...)”(cf. A Mulher Na Reforma Política. Câmara dos Deputados. Centro de Documentação e Informação. Edições Câmara, Brasília, 2009).
Muito boa sua síntese do evento. Maravilha que também chegou à "grande imprensa". Abs.
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