A
linha do tempo da história de Belém na minha vida tem um início bem definido:
um tempo escolar em que esta cidade acolhia pré-adolescentes em fase de
prosseguir seus estudos, haja vista que nas demais cidades interioranas só
havia o ensino elementar, ou o chamado ensino primário, uma das etapas da
educação básica no Brasil. Era praxe, como dantes (jovens que seguiam para o
exterior) e ainda agora (hoje com maiores facilidades porque há escolas de
ensino médio em todas as cidades paraenses), os pais que tinham posses,
inscreverem seus filhos e filhas nos colégios da capital. Alguns eram
hospedados em casa de parentes, outros, sem essa facilidade, tinham que arcar
com recursos próprios para que seus filhos/as ficassem internos em colégios
particulares, nesse caso, o Instituto Santa Rosa, o Santo Antonio, o Gentil
Bittencourt, o Santa Catarina, o Lar da Providência, para as meninas, e para os
meninos, o Colégio do Carmo e o Nazaré. Havia os semi-internatos, casas
familiares que recebiam jovens interioranos, como o da casa da Professora
Nídia.
Desde
pré-adolescente, então, reconheci esta cidade como o espaço que me daria uma
formação aspirada pelos meus pais, e nessa trajetória, os anos se passando, a
aclimatação me deu oportunidade de convívio com a geografia do território onde
as letras do saber mais apurado iam se acumulando e o reconhecimento sobre o
cotidiano desse espaço se tornava mais um saber a dividir, em períodos de
férias, com os familiares e/ou os amigos interioranos.
É
desse tempo que suponho ter passado a amar esta cidade que mais tarde se tornou
o berço das minhas filhas e hoje, de netos/as e de um bisneto. O deslocamento
residencial circunstancial entre os bairros belenenses definiu o meu
entendimento sobre as políticas urbanas que se faziam de forma diferenciada
reconhecendo o que era centro, médio-centro, periferia e vilas-satélites. A
convivência, desde a adolescência, com essas comunidades, mostrava-me a
circunscrição habitacional revelando-se áreas de moradia, de comércio, de
feiras, de acumulação do lixo que era recolhido e levado para o forno
crematório (desativado há algum tempo), um local do Bairro da Cremação criado
na administração do Intendente Municipal Antonio Lemos como medida de
saneamento. Os lugares públicos como as praças ficavam sempre nas áreas do
centro da cidade, efeito ainda desse processo de urbanização lemista. Casas
edificadas de tipos semelhantes às imagens de residências européias mostravam o
garbo de um passado que teria sido de grande riqueza e empenhado nos emblemas
de títulos como o de “Metrópole da Amazônia" ou de "Cidade das
Mangueiras".
Deslocando
minha trajetória escolar de uma fase de reconhecimento meio superficial para
uma outra agora em nível de pós-graduação tive acesso à história regional
escrita e comentada verbalmente, à documentação sobre as políticas públicas que
foram propostas, legisladas e executadas e algumas impostas durante as várias
gestões no governo municipal de Belém do princípio do século XX. E desse
acúmulo de informações onde o centro da minha questão eram as mulheres na
política testemunhei, entre versões sobre os fatos ocorridos em ao menos dois
períodos histórico-republicanos, os litígios entre “príncipes” da política
local que se digladiaram, se arruinaram, foram depostos e expulsos da cidade. A
crise entre Antonio Lemos e Lauro Sodré e suas “entourages” que levou à
deposição e expulsão do primeiro há mais de cem anos (1912) demonstrou ser em
decorrência de modos políticos de governar. A denúncia da oposição contra o
“velho” Lemos cujo apogeu de mando se dá entre 1904-1909, mas durante 15 anos
no poder da cidade, se inclinava a considerar que sua gestão se realizava de
forma patrimonialista e dirigida às classes sociais altas, as únicas que podiam
legitimar a forma de urbanização e promoção da beleza da cidade cujo modelo ele
captava do governo Pereira Passos, do RJ, e da influência europeia na
arquitetura das edificações. Essa denúncia gerenciava a criação de movimentos
sociais chamadas de “frentes patrióticas” em forma de ligas intituladas “Liga
Moral de Resistência”, “Centro de Resistencia ao Lemismo”, “Clube Democrático
Lauro Sodré”, “Liga Feminina Lauro Sodré” que objetivavam “empreender campanhas
que solucionassem a chamada "anarquia social", supostamente
estabelecidas nacionalmente desde o período de Campos Sales, com a
centralização do poder das oligarquias estaduais.
Com
a interventoria de Magalhães Barata, em uma segunda república, a gestão da
cidade deu-se entre novos rumos onde as políticas do Programa da Aliança
Liberal promoveram medidas de cidadania fortalecendo a base de políticas
públicas para a classe operária, por exemplo, cuja situação deixou de ser
tratada como “caso de polícia” para ser favorecida como questão social. O
urbano belenense teve uma nova reconfiguração também, pois, as fábricas foram
acompanhadas pelo gestor estadual que tomava para sí os desmandos de
pauperização da população e as condições insalubres em que trabalhava o
operariado.
Numa
Terceira República, pós-1945, a revalidação das questões sociais trouxeram a
reconfiguração do espaço urbano cuja “desodorização” (termo usado por Nazaré
Sarges) deixou de ser por uma estética plástica da cidade, mas de atenção por
novos espaços de sociabilidade intra-classes sociais. Praças públicas que
vinham sendo deslocadas de lugares centrais para bairros periféricos, a
territorialidade estendeu-se para pensar em outros significados ditados pelas
políticas públicas que eram exigidas então e implementadas segundo a vontade
política do gestor.
Hoje,
o que pedimos como presente para festejar o aniversário de Belém, no caso esses
400 anos? Que os gestores administradores da cidade avaliem quais políticas
ainda estão nas gavetas e, conforme as possibilidades, implante-as, em torno de
áreas tão carentes como educação, saúde, saneamento, segurança e a cultura, um
dos ramos mais esquecidos ainda.
Nestes
400 anos circularam na cidade muitas promessas de melhoria de vivência para a
população. Se Antônio Lemos (1897-1911) marcou o período de urbanização da
cidade concedendo partes do território urbano para o investimento com recursos
privados de um empresariado que se locupletou dessas benesses, mas deixou um
cenário simbólico da riqueza amazônica, Edmilson Rodrigues (1997- 2004) já nos
anos noventa do século XX recuperou parte do prestigio de marcos históricos e
investiu em novas imagens para levar ao apogeu alguns símbolos locais que
estavam desprestigiados. E nessa nova moldura incluiu as demandas de uma população
que definiu em assembleias populares a aplicação dos recursos a serem aplicados
no beneficiamento de demandas dos cidadãos que faziam parte da cidade.
Mesmo
que desfigurados, os documentos tradicionais e históricos desse tempo da
fundação da cidade, o belenense ama a sua terra e por isso pede que neste
momento de comemorações o poder público não esqueça que além das melhorias de
uma fachada arquitetônica não deixe de reconhecer que a cidade só é forte por
que seu povo faz dela o seu grande apoio afetivo.
alguem pode me ajudar se um dia houve em belém a loja A GRANFINA onde vendia tecidos, localizada na pedro alvares com avenida dalva?
ResponderExcluir