Figura extraida de http://vidaarteedireitonoticias.blogspot.com.br
Em
10 de dezembro de 1948, a ONU adotou e proclamou a Declaração Universal dos
Direitos Humanos. O mundo ainda se debatia nos recentes episódios da 2ª Guerra
mundial e as nações se preocuparam em selar pactos que propiciassem a defesa do
que se constituiam nos direitos fundamentais da pessoa humana. Estes foram traduzidos,
segundo T.A. Marshall, entre os direitos
civis (como o direito à vida, segurança, justiça, liberdade e igualdade),
políticos (o direito à participação nas decisões políticas), econômicos
(direito ao trabalho), sociais (direito à educação, saúde e bem-estar),
culturais (direito à participação na vida cultural) e ambientais (direito a um
meio ambiente saudável). Ou seja, no regime democrático trata-se de direitos
fundamentais o viver com dignidade, respeito e proteção aos bens físicos e
pessoais independente de origem social e econômica, raça, etnia, gênero, idade,
credo religioso, orientação ou identidade sexual e ideologia política.
Embora a noção de direitos faça parte
das condições da vida humana, ela esteve presente, dizem alguns pensadores, ao
longo dos últimos três milênios civilizatórios. Foi no período axial, segundo
Fábio Konder Comparato, entre 600 a 480 a.C. que se estabeleceram os grandes
princípios e as diretrizes fundamentais da vida até hoje em vigor. Sua
referência evidencia a coexistência, sem comunicação entre sí, dos maiores
pensadores de todos os tempos entre os quais destaca Zaratrustra (Pérsia), Buda
(Índia), Lao Tsé e Confúcio (China), Pitágoras (Grécia) e o dêutero Isaias, o
profeta (Israel), cujas idéias se desdobraram em ensinamentos e doutrinas de
apoio às diretrizes fundamentais da vida humana (cf. Comparato, F.K. A
Afirmação histórica dos Direitos Humanos, Ed. Saraiva 2010). O filósofo alemão
Karl Jasper (1883-1969), da escola do existencialismo e do neokantismo, refere
o período axial com a raiz primária responsável pelo “mais rico desabrochar do
ser humano”.
Embora um retrospecto acronológico para
tratar desse tema que ainda é hoje considerado controverso, por alguns (há os
que questionam o direito a tratar bem os delinquentes e presos etc.), na
verdade, o mote é a avaliação do que essa situação dos direitos humanos tem
fomentado para pensar os direitos de cidadania, nas sociedades democráticas.
A síntese do documento de 1948 evidencia
o teor dos 30 artigos nele contidos. Veja-se: “A presente Declaração Universal dos Diretos Humanos como o ideal
comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de
que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta
Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o
respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas
de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua
observância universais e efetivos, tanto entre os povos dos próprios
Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição.”
Essa súmula remete ao que consta, por
exemplo, na Constituição brasileira de 1988, Título I - Dos Princípios Fundamentais. “Art. 3º: I - construir uma sociedade livre,
justa e solidária; II
- garantir o desenvolvimento nacional;
III - erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Os
elos são claros entre os dois documentos sobre como prover e o que prover
quanto aos benefícios necessários ao desenvolvimento da pessoa humana. A ênfase
da súmula do documento de 1948 é o atingimento dos beneficios a todos/as
através do ensino e da educação que serão as ferramentas para a promoção dos
direitos e liberdades e, subsequente, a adoção de ações para a garantia
progressiva das mesmas. Na constituição brasileira, em que pese todos os itens
serem vitais para a preeminência dos direitos fundamentais, a formulação do
primeiro e do quarto item envolvem uma grande eficácia para a garantia da
cidadania.
Nesse patamar aproximo os dois
valores – direitos e cidadania – usando a argumentação de um dos maiores
pensadores brasileiros, o historiador, cientista político e acadêmico (ABL) José
Murilo de Carvalho, que em seu livro “Cidadania no Brasil. O longo Caminho” (
3ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002, 226 pag.), ao criar o que
ele chama de “mapa da viagem” argumenta desde os primeiros passos da cidadania
no Brasil e conclui com a “cidadania na encruzilhada” (quem tiver interesse no
livro está numa cópia on line). Para esse historiador, a “Cidadania plena: combina liberdade, participação e igualdade
para todos” e, enquanto ideal ocidental se torna um parâmetro quase
inatingível, mas importante de ser perseguido. Se o individuo só possui um dos
direitos (dentro daquele conjunto explorado na dimensão dos direitos civis,
políticos e sociais) então é um “cidadão incompleto”. Por outro lado, se não se
acha em nenhuma dessas dimensões é um “não-cidadão”.
Para José Murilo, contudo, “O
exercício de certos direitos, como a liberdade de pensamento e o voto, não gera
automaticamente o gozo de outros, como a segurança e o emprego. O exercício do
voto não garante a existência de governos atentos aos problemas básicos da
população”. (...)
A argumentação que é feita nesse teor espera mostrar que as demandas
por políticas públicas que emergem em cada tempo das preocupações dos
movimentos sociais e identitários organizados têm sido uma salvaguarda para que
direitos e cidadania sejam estabelecidos e distribuidos pelo estado-nação
contemplando aqueles/as que ainda são cidadãos de segunda categoria ou
não-cidadãos e, consequentemente, ainda estão de fora dos beneficios do sistema
político-social. Afinal, o bem estar dos indivíduos deve ser a razão de ser de
uma sociedade que se preocupa com os humanos direitos.
(Texto originalmente publicado em "O Liberal", de 06/12/2013)
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